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Eficiência: o bom caminho a ser trilhado

Eficiência: o bom caminho a ser trilhado

Texto: Marcelo de Rezende, Eng. Agrônomo, Cooperideal – Londrina, P

 A melhoria da renda gerada na propriedade leiteira é fruto do incremento de produtividade, que resulta da adequada interação entre o uso eficiente da terra, melhor desempenho animal e da margem de ganho obtida por cada litro de leite produzido. Com maior produção em uma mesma área e maior margem de ganho por litro, o produtor passa a maximizar o desempenho econômico do seu negócio, quebrando os paradigmas estabelecidos pela falta de entendimento técnico da atividade.

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A produção de leite tem crescido a passos largos na região Sul do Brasil. No período de 2000 a 2014, o Sul apresentou um crescimento de produção quase duas vezes maior que o crescimento da produção nacional no período (150% contra 78%), com destaque para o Estado de Santa Catarina, que cresceu ainda mais (197%) em relação ao crescimento do volume de leite produzido no país. Além de ser uma grande referência na produção de aves e suínos, Santa Catarina é atualmente o quinto maior produtor de leite do Brasil, tendo produzido 2,98 bilhões de litros em 2014, aproximadamente 8,5% da produção nacional, com a região Oeste do Estado concentrando mais de 70% da produção. De acordo com informações do IBGE (2006), são 80.773 fazendas produtoras de leite, sendo que mais de 90% delas possuem mão de obra totalmente familiar e produzem em uma área inferior a 50 hectares.

Os dados do IBGE nos permitem estimar que em 2006 o volume produzido pela fazenda leiteira média de Santa Catarina não ultrapassava os 60 litros/dia, e mesmo com as altas taxas de crescimento relatadas nos últimos anos, provavelmente essa produção média ainda não alcance hoje os 100 litros/dia, caracterizando a atividade como de baixa escala de produção na grande maioria das fazendas. Tal situação coloca a atividade leiteira de Santa Catarina na mesma situação de dificuldade encontrada nas demais regiões do país, onde a baixa escala de produção inviabiliza a geração de renda, trazendo sérias consequências para quem vive da atividade.

A não aplicação de conceitos produtivos e gerenciais que tenham como foco principal o aumento da renda da propriedade atinge diretamente o pilar de sustentação do homem no campo, que vê suas necessidades econômicas aumentarem em função dos custos crescentes de manutenção da família, que cada vez mais sente necessidade de bens de consumo que até então eram exclusivos do meio urbano. Ao não atender tais necessidades, a produção de leite passa a ser vista como um mau negócio, incapaz de gerar receitas que cubram as despesas operacionais da atividade e que possibilitem a manutenção das necessidades básicas da mão de obra envolvida, especialmente em propriedades onde a força de trabalho é oriunda da família.

A falta de renda também torna a atividade penosa, pois não possibilita que sejam feitos os investimentos necessários para a continuidade da atividade, de maneira que sejam melhoradas, através da mecanização e automação das tarefas, as condições de trabalho dos envolvidos com a produção. Além disso, a falta de renda também inviabiliza o pagamento de depreciações, promovendo o sucateamento do patrimônio (máquinas, equipamentos e instalações) e impede também a remuneração do capital investido no negócio, corroendo o dinheiro investido, que pela falta de correção, perde seu valor no decorrer dos anos. O baixo nível de conhecimento técnico aplicado à atividade em grande parte das fazendas produtoras torna impossível a obtenção do lucro com o leite, que no final das contas paga por todas as ineficiências da má condução técnica e gerencial.

 

Perfil regional

A melhoria da renda gerada na propriedade leiteira é fruto do incremento de produtividade, que resulta da adequada interação entre o uso eficiente da terra (pelo acréscimo na produção de forragem), melhor desempenho animal (aplicação correta de técnicas de manejo e de conforto dos rebanhos) e da margem de ganho obtida por cada litro de leite produzido (oriundo da correta aplicação de conceitos gerenciais). Com maior produção em uma mesma área e maior margem de ganho por litro, o produtor passa a maximizar o desempenho econômico do seu negócio, obtendo resultados satisfatórios com o trabalho realizado, de maneira a quebrar os paradigmas estabelecidos pela falta de entendimento técnico da atividade.

Em Santa Catarina, apesar das dificuldades com o relevo muito acidentado, terras caras e instabilidade climática (tempestades e secas), a estrutura produtiva do leite ainda é muito competitiva, tendo como pontos favoráveis a estrutura familiar presente na grande maioria das fazendas, as comunidades rurais que favorecem a permanência e organização das famílias e a aptidão natural para a produção de leite de famílias com origem europeia. Grande parte dos rebanhos é composta por animais especializados na produção de leite, e as áreas disponíveis, normalmente pequenas quando comparadas a outras regiões do país, exigem a aplicação de maior nível de conhecimento para que os resultados produtivos apareçam, limitando, de certo modo, a participação de amadores no negócio. Outro ponto favorável é a disponibilidade de matéria orgânica oriunda da produção de aves e suínos que, quando aplicada em áreas onde são utilizadas intensivamente plantas forrageiras tropicais de alto potencial produtivo no período do verão, e plantas de clima temperado de alta qualidade no inverno, possibilita tanto o incremento na quantidade quanto na qualidade da forragem produzida, melhorando a capacidade de suporte e a competitividade econômica das propriedades.

Para ilustrar o que foi dito sobre a atividade leiteira e suas potencialidades em Santa Catarina, vamos analisar o Sítio Gomes, localizado no município de Abelardo Luz, na região Oeste do Estado. Na propriedade vivem os pais Sr. Noir Gomes e Dona Carlinda, que juntamente com o filho Luis Carlos, a nora Rosângela e a neta Julia tocam a atividade leiteira. O trabalho de acompanhamento técnico da propriedade teve início em 2010, e na época a produção diária não passava dos 140 litros, mesmo a propriedade utilizando 18,0 ha de terra para a atividade. Com a propriedade localizada em uma região de terras valorizadas, com preços ao redor de R$ 30.000,00/ha, de início era possível perceber que o alto valor investido em terra dificilmente seria remunerado adequadamente diante de uma produção tão pequena. Além disso, o capital investido não se restringia somente a terra, pois a produção de leite, como uma atividade econômica, deveria também remunerar o dinheiro investido em máquinas, equipamentos, instalações e animais do rebanho.

Diante de um investimento patrimonial total de R$ 586.250,00 — existente na propriedade em 2010 — era necessário o investimento de R$ 4.187,50 para a produção de cada um dos 140 litros produzidos diariamente no Sítio. O índice “R$ investidos/litro de leite produzido (R$/litro)”, fruto da divisão do valor do patrimônio pela produção diária da fazenda, quando superior a R$ 1.500,00/litro nos indica excesso de investimentos em relação ao que é produzido, com implicações sobre o tempo necessário para que o capital aplicado seja recuperado, que nesse caso torna-se demasiadamente longo. Esse índice, normalmente excessivamente alto nas fazendas brasileiras, nos mostra também que a prioridade deve ser a aplicação de ações com impacto direto no aumento da produção de leite e, se possível, com a redução de investimentos improdutivos (diminuição da área utilizada, de animais improdutivos, venda de máquinas e implementos não utilizados na atividade, etc.). A situação inicial do Sítio Gomes era muito parecida com a realidade da grande maioria das propriedades leiteiras no Brasil, onde sobram investimentos improdutivos (capital imobilizado) e falta leite (renda).

 

A mudança

O diagnóstico inicial da propriedade mostrava que a situação não era favorável, mas a família Gomes estava decidida a virar o jogo. A primeira providência foi visitar duas propriedades da região de São Lourenço D´Oeste-SC, onde o trabalho da Cooperideal atende propriedades desde 2005. Na ocasião, o produtor Luís Carlos pôde conhecer de perto a metodologia que estava sendo proposta de maneira a ganhar confiança para desenvolver o trabalho na sua propriedade. Já na visita seguinte, o agrônomo Caciano Mafioletti, técnico da Cooperideal que assiste a propriedade, levantou a estrutura disponível no sítio, avaliou a composição do rebanho e a possibilidade de se estruturar áreas de pastejo perenes, visto que até então a propriedade produzia seu volumoso a partir do plantio anual de culturas como sorgo forrageiro. Uma área de 1,0 ha de trevo já existente na propriedade foi recuperada e foi iniciado o plantio de 0,9 ha de Tifton 85, que receberia o pastejo das vacas em lactação no verão seguinte. O produtor passou a fazer anotações sistemáticas dos eventos zootécnicos e econômicos ligados à atividade e tais informações passaram a ser lançadas mensalmente em uma planilha de avaliação, cujo objetivo era a geração de indicadores que pudessem balizar as ações a serem executadas a partir daquele momento. Iniciava-se, dessa forma, o trabalho com foco no aumento na produtividade das pastagens, na melhoria da alimentação e sanidade do rebanho e na gestão da atividade no Sítio Gomes.

Em novembro de 2010 a propriedade passou a dividir o rebanho em lotes, de acordo com a produção verificada no controle leiteiro mensal individual dos animais. Com o sistema de pastejo de Tifton estabelecido, foram selecionados os animais de maior produção que teriam acesso à área. Como a área estabelecida com o Tifton era insuficiente para as 12 vacas em lactação do rebanho na época, uma área de Hemártria e outra de Quicuio também foram recuperadas, divididas em piquetes e utilizadas para pastejo naquele verão de 2010/11. No inverno de 2011 a propriedade estabeleceu áreas de Azevém, capazes de manter adequadamente alimentadas as vacas em lactação no período. Na entrada do verão seguinte um novo sistema de pastejo de Tifton (0,7 ha) foi estabelecido.

Em maio de 2012 a propriedade já tinha 14 vacas em lactação, atingindo uma produção diária de 336 litros. A produção média por vaca já se aproximava dos 24,0 litros/dia, e tanto o local como o equipamento de ordenha (tipo balde ao pé com dois conjuntos de teteiras), já antigo, se apresentavam como um limitante em relação às condições produtivas do rebanho e ao padrão de conforto para a realização do trabalho de ordenha dos animais. Em julho/12 uma nova sala de ordenha foi construída, o que facilitou o trabalho da família, pois a produção já se aproximava dos 400 litros/dia. Nesse mesmo inverno foram estabelecidos os cultivos de Aveia de ciclo longo e híbridos de Azevém adaptados às condições da região. No início do verão de 2012 foram estabelecidos 2,09 ha de capim Jiggs, que permitiria que se trabalhasse no verão com uma planta de maior capacidade de suporte na área próxima à nova sala de ordenha.

Atualmente a propriedade conta com dois sistemas de pastejo intensivo de verão, sendo o módulo I composto por 1,59 ha de Tifton 85 divididos em19 piquetes de 740 m² e o módulo II por 2,09 ha de Jiggs divididos em 18 piquetes de 1.086 m². No verão também é feito o plantio de 1,0 ha de milho para silagem. No período do inverno são pastejadas áreas de Aveia e Azevém. Uma área excedente de Azevém é utilizada para a produção de feno, que é fornecido para as bezerras e novilhas no decorrer do ano.

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Uma nova realidade
 

As primeiras ações técnicas recomendadas à família Gomes visavam, sobretudo, melhorar as condições de alimentação do rebanho existente na propriedade. Os indicadores da Tabela 1 demonstram que a intensificação no uso da terra, através da melhoria de fertilidade e estabelecimento de sistemas de produção intensiva de pastagens, permitiu que a propriedade melhorasse sua capacidade de suporte e aumentasse o número de vacas em lactação (de 11,2 em 2010/11 para 20,5 em 2015), mesmo reduzindo a área utilizada para a produção de leite (de 18,0 para 11,0 ha). O melhor uso da terra e a melhoria da reprodução, com impacto sobre o aumento da “% de Vacas em Lactação”, que saiu de 77,2 para 87,9%, interferiu diretamente na melhoria do índice “Vacas em Lactação por hectare (VL/ha)”, que saltou de 0,62 para 1,86. Com mais vacas em lactação na propriedade, maior foi a produção, que partiu de 140 litros/dia na primeira visita técnica, chegou a 251 litros/dia ao final do primeiro ano de trabalho, para depois subir para 549 litros/dia, em média, no ano de 2015. Nesse último período a propriedade teve como maior produção 664 litros/dia, utilizando apenas 11,0 ha da propriedade.

A média de produção por vaca/dia, que era de 19,0 litros antes do acompanhamento técnico da propriedade, subiu para 24,0 no primeiro ano de trabalho, para subir ainda mais e atingir 26,8 litros em 2015, demonstrando a potencialidade da produção de animais quando mantidos em sistemas de pastejo intensivo e bem manejado. Na esteira do aumento da produção, veio a melhoria da renda gerada pela atividade: a “Margem Bruta”, oriunda da diferença entre receitas e despesas de custeio, que em 2010/11 foi de R$ 51.862,42, subiu para R$ 86.395,91, o que permitiu que a propriedade pudesse reinvestir R$ 19.704,93 na atividade em 2015 e ainda embolsasse, conforme demonstrado pelo “Fluxo de Caixa” da atividade, o valor de R$ 66.690,98.

Apesar da valorização natural do patrimônio (principalmente pela valorização da terra e aumento do rebanho) ocorrida entre os dois períodos de avaliação, o valor do patrimônio da atividade diminuiu (de R$ 586.250,00 para R$ 516.797,00) em função do trabalho de intensificação que fez com que a atividade necessitasse hoje de menos área para a produção de leite (de 18,0 para 11,0 ha). Com redução da área utilizada e aumento da produção, a produtividade da atividade aumentou em mais de três vezes, saindo de 6.036 para 18.762 litros/ha/ano. A diminuição do investimento necessário e a maior produção de leite fizeram com que o índice “R$ investidos/litro produzido” se estabelecesse em um patamar considerado bom. É preciso lembrar que no momento da primeira visita técnica na propriedade o valor desse índice era de R$ 4.187,50, sendo reduzido para R$ 2.335,65 ao final do primeiro ano de trabalho e depois para o valor atual de R$ 941,34.

Outro ponto importante a ser destacado é o fato de que a melhoria dos índices produtivos e econômicos do Sítio Gomes fez com que a atividade fosse capaz de remunerar o capital investido na atividade, mesmo considerando-se as despesas com depreciações de máquinas, equipamentos e instalações da propriedade. O retorno sobre o capital investido na fazenda, que inicialmente era de 2,34%, subiu para 9,9% ao ano, tornando o investimento no negócio leite atrativo também do ponto de vista econômico.

O exemplo da família Gomes demonstra que a produção de leite pode e deve ser uma atividade rentável para os produtores envolvidos, mas que o resultado final do negócio será proporcional ao nível de conhecimento aplicado na condução da atividade. Ao técnico cabe o importante papel de levar esse conhecimento ao produtor, atualizando sempre seu arsenal de ferramentas tecnológicas, utilizando cada ferramenta de acordo com a real necessidade de cada propriedade, estando sempre apto para muito ouvir, para então intervir com cuidado e precisão. Ao produtor cabe buscar o apoio de um bom técnico, trabalhar duro, controlar e acreditar sempre, pois a eficiência é o bom caminho a ser trilhado!

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