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Sanidade

Mastite contagiosa ou ambiental: Um diagnóstico em nível de rebanho

Mastite contagiosa ou ambiental: Um diagnóstico em nível de rebanho

Texto: Marcos V. dos Santos, Tiago Tomazi

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Os microrganismos causadores de mastite são classicamente divididos em espécies contagiosas ou ambientais. A distinção entre estes dois grupos de microrganismos depende, principalmente, de sua forma de transmissão. O perfil de bactérias contagiosas é caracterizado pela transmissão de vaca para vaca, enquanto o perfil de transmissão ambiental é caracterizado pela infecção da vaca por bactérias de origem do ambiente. O diagnóstico de mastite contagiosa ou ambiental em nível de rebanho só pode ser realizado com precisão quando as três fontes de informações (análise dos dados, avaliação dos fatores de risco e perfil de infecção) são avaliadas detalhadamente.

Contagiosa ou ambiental?

Microrganismos contagiosos são tipicamente mais adaptados à vaca e causam infecções persistentes sem sintomas clínicos graves. Os agentes contagiosos mais comumente isolados da mastite são Staphylococcus aureus e Streptococcus agalactiae. O principal reservatório destes patógenos é o úbere de um animal infectado, e as infecções são disseminadas entre as vacas ou entre os quartos mamários durante a ordenha por meio de equipamentos contaminados, mãos dos ordenhadores, ou panos usados em mais de uma vaca. Nesse caso, as infecções tendem a persistir na glândula mamária apresentando-se na forma subclínica com episódios clínicos intermitentes. Mastites contagiosas são associadas com redução da produção e aumento na CCS do leite de tanque. Como a transmissão de vaca para vaca é a fonte primária de novas infecções intramamárias (IIM), práticas de manejo como desinfecção dos tetos pós ordenha, segregação de vacas, tratamento durante a lactação e protocolos de secagem e descarte de vacas infectadas fazem parte de programas de prevenção contra mastite contagiosa.

Por outro lado, microrganismos ambientais são considerados agentes oportunistas que normalmente causam mastites transitórias, porém com maior frequência de casos clínicos graves. Os agentes ambientais de maior relevância em IIM são os coliformes e espécies de estreptococos, exceto o S. agalactiae. A fonte principal de agentes ambientais é o próprio local onde a vaca vive. Normalmente, a mastite ambiental apresenta-se mais na forma clínica que subclínica e é caracterizada como uma infecção curta, que resulta em queda brusca da produção de leite, e até mesmo, a morte da vaca. Infecções intramamárias ambientais normalmente têm origem no período seco, e independem da presença de outras vacas infectadas pelo mesmo microrganismo. Casos de mastite ambiental são mais comuns em propriedades com baixa CCS do leite de tanque. A manutenção do ambiente seco e limpo e a estimulação da resposta imune das vacas são as principais práticas de manejo adotadas em programas de prevenção deste tipo de mastite.

Com base em estudos com ferramentas de biologia molecular, várias técnicas que estudam o material genético de microrganismos têm sido utilizadas para identificar espécies e subespécies bacterianas na Medicina Veterinária. O avanço das técnicas de microbiologia molecular possibilita a distinção entre surtos de mastite clonais (causados por uma mesma cepa bacteriana) de surtos não-clonais (causados por cepas ou espécies distintas) em  nível de rebanho. Os estudos atuais demonstram que em surtos de mastite causados por bactérias com perfil de transmissão contagioso, um único tipo de cepa bacteriana é isolado em vacas infectadas. Em contraste, em IIM com perfil de transmissão ambiental, é mais provável que qualquer infecção esteja relacionada com sua própria cepa de coliforme ou estreptococo.

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Embora exista uma divisão clássica das espécies quanto ao perfil de transmissão, estudos recentes apontam para uma dificuldade de classificação dos agentes causadores de mastite como contagioso e ambiental. Na representação esquemática abaixo, S. agalactiae é considerado totalmente contagioso e a E. coli totalmente ambiental, sendo que os demais agentes apresentam padrões intermediários de modo de transmissão.

Com a disponibilidade de técnicas de diagnóstico cada vez mais precisas, a distinção clássica entre microrganismos causadores de mastite ambientais e contagiosas parece ter cada vez menos sustentação. Um estudo mais detalhado dos surtos causados por espécies bacterianas, classicamente definidas como ambientais, mostrou que estas espécies (ou surtos) podem ter características de agentes contagiosos. Um exemplo disto foi a ocorrência de dois surtos de mastite por Klebsiella spp. observados por pesquisadores americanos. Os isolados de Klebsiella do leite, fezes, e instalações foram comparados por meio de uma técnica de identificação por microbiologia molecular (PCR de DNA polimórfico amplificado ao acaso). O primeiro surto de mastite foi causado por uma cepa comum de Klebsiella pneumoniae isolada no leite de oito vacas. Esta mesma técnica foi utilizada em amostras coletadas dos conjuntos de teteiras após a ordenha e das camas das vacas infectadas. A predominância de uma cepa comum em todas as vacas infectadas poderia ter indicado tanto o potencial de transmissão contagiosa do microrganismo, quanto a exposição de várias vacas a um mesmo reservatório ambiental. No entanto, quando métodos de controle foram utilizados com objetivo de prevenir a transmissão pelo equipamento de ordenha, nenhum novo caso de mastite foi observado.

Um segundo surto de mastite causado por Klebsiella spp. ocorreu na mesma fazenda vários meses após o primeiro. No entanto, observou-se que o surto foi causado por cepas distintas desta espécie bacteriana, o que exclui a possibilidade de transmissão contagiosa e indica que infecções oportunistas originadas no ambiente causaram a doença. Estes estudos indicam a necessidade de reavaliação da classificação de espécies bacterianas como causadoras de mastite contagiosa ou ambiental.

Antes de se optar por um programa de prevenção de mastite, é necessária uma melhor identificação do perfil de transmissão dos microrganismos, o que será mais preciso se forem consideradas as seguintes fontes de informação: 1) análise dos dados de CCS e registros de mastite clínica; 2) avaliação dos principais fatores de risco conhecidos na literatura, e 3) perfil de IIM do rebanho baseado em resultados de cultura microbiológica e identificação de cepas bacterianas isoladas no rebanho.

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Análise de dados

A análise dos dados de sanidade da glândula mamária é o primeiro passo no diagnóstico dos perfis de transmissão de agentes causadores de mastite em nível de rebanho. Recomenda-se que ambos os dados de CCS individual e registros de ocorrência de mastite clínica estejam disponíveis para análise. Com esses dados é possível obter uma primeira indicação dos prováveis padrões de transmissão de IIM em um rebanho. Características importantes da transmissão contagiosa são: longa duração das IIM; CCS do leite de tanque relativamente alta; ocorrência de múltiplos casos clínicos de mastite em um único quarto mamário; alta CCS nos meses antecedentes à ocorrência de mastite clínica; e correlação positiva entre a prevalência de infecções existentes e o risco de novas infecções pelo mesmo patógeno.

Por outro lado, características importantes da transmissão ambiental são: duração relativamente curta das IIM; baixa CCS do leite de tanque; alta incidência de casos clínicos de mastite; ausência de IIM de longa duração; baixa CCS individual antes da ocorrência de casos de mastite clínica; alta incidência de IIM com sinais clínicos imediatamente após o parto; e ausência de correlação positiva entre a prevalência de infecções existentes e o risco de novas infecções pelo mesmo agente.

Dados individuais periódicos de CCS são muito informativos para determinar o perfil de transmissão de mastite em uma propriedade leiteira. Longos períodos (acima de 2 meses) de alta CCS  indicam o potencial de transmissão contagiosa de mastite no rebanho. Já em rebanhos onde ocorrem surtos de mastite ambiental, o período de alta CCS (> 200.000 células/mL) normalmente é mais curto devido ao perfil agudo deste tipo de infecção. Outra forma que auxilia no diagnóstico do perfil de transmissão se dá por meio de análises de correlação entre o percentual de novas vacas com alta CCS por teste e o percentual de vacas com persistência de alta CCS no mesmo teste.

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Avaliação dos fatores de risco

A segunda fonte de informações fundamentais para identificação do perfil predominante de transmissão de mastite em nível de rebanho baseia-se em uma avaliação criteriosa dos fatores de risco relacionados à mastite. Estes fatores de risco estão compreendidos nas seguintes categorias: biosseguridade, procedimentos de ordenha, sistema de ordenha, tratamento de IIM, higiene do animal e condição das instalações, e manejo de susceptibilidade. Para cada categoria, questionários, observações e mensurações devem ser realizadas rotineiramente. Para uma avaliação adequada, as respostas devem ser padronizadas a fim de se obter um escore de pontuação. Para cada uma das categorias, também é adicionado um escore geral baseado na opinião de consultores. Este último é muito importante, já que muitos produtores já estão cientes dos principais fatores de risco envolvidos com a sanidade do úbere e realizam práticas de manejo para prevenir a mastite. Contudo, a forma de aplicação das melhores práticas de manejo difere entre fazendas. Por exemplo, muitas fazendas usam desinfetantes de tetos após a ordenha, no entanto, em muitos casos, a cobertura dos tetos com o desinfetante é relativamente pobre. Desta forma, mesmo que a fazenda esteja aplicando as melhores práticas de manejo conhecidas, o escore geral do técnico responsável poderá ser mais baixo em fazendas com execução inadequada destas práticas.

O Quadro 1 ilustra um exemplo de avaliação de risco da mastite. O resultado final desta avaliação demonstrou uma pontuação específica para cada uma das seis áreas de risco identificadas e uma pontuação geral de 71%. A pontuação foi dimensionada de tal forma que 100% é um resultado perfeito e 0% é um resultado extremamente deficiente. Nesse exemplo, a fazenda em questão tem duas áreas de alto risco (biosseguridade e sistema de ordenha). Os problemas de biossegurança nesta fazenda foram relacionados à compra de animais de reposição, em que não existia um plano de análise microbiológica do úbere dos animais que entravam no rebanho. O fator de risco relacionado ao sistema de ordenha consistiu em um problema de flutuação de vácuo e ausência de manutenção periódica do equipamento de ordenha. Com base nessa avaliação, a fazenda apresentou alto risco de desenvolvimento de infecção com perfil contagioso.

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