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Qualidade do Leite

Qualidade na cadeia produtiva do leite

Qualidade na cadeia produtiva do leite

Joaquim E. S. Amado - PhD em Ciência Animal com concentração em Saúde Pública e Microbiologia, Professor do curso de veteinária da PUC Minas  - Equipe ReHAgro

 

Em 1864, o francês Louis Pasteur desenvolveu o primeiro processo de tratamento térmico industrial de vinho e cerveja.  A pasteurização consiste em aquecer o leite abaixo do ponto de fervura até que seja possível a eliminação de microorganismos presentes no leite cru. Com o uso da pasteurização, a comercialização do leite ultrapassou os limites das regiões imediatamente próximas às fazendas de produção leiteira.  Em 1972, foi produzido no Brasil o primeiro litro de leite Ultra Pasteurizado envasado em embalagem asséptica. Desde então, a indústria de laticínios vem ganhando espaço com o leite longa vida, enquanto o pasteurizado vem sendo menos procurado.

Na cadeia produtiva do leite, os diversos elos são co-responsáveis pela qualidade do produto final. Obviamente, cada etapa tem cuidados específicos que devem ser tomados para que se obtenha um produto final de qualidade.

 

Na fazenda

A melhor das estimativas indica que o leite, ainda dentro do teto do animal, está exposto a uma flora bacteriana capaz de contaminá-lo ao nível de 103 UFC/ml. Ao ser extraído, na melhor das hipóteses, o leite será exposto à flora contaminante da superfície do teto e do ambiente, que poderão e-levar a contagem bacteriana para 104 a 105 UFC/ml.  Caso a higienização do teto e do úbere não seja feita de forma eficiente, estes valores podem aumentar substancialmente.  Com toda certeza, este aumento será ainda maior em casos de mastite, que elevarão a concentração de microorganismos, em especial os patogênicos, presentes no interior do teto afetado.

A facilidade com que o leite pode ser contaminado no processo de ordenha deve ser uma preocupação diária do produtor rural.  Esta preocupação será ainda mais evidente assim que a Instrução Normativa 51 do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento de 2002 atingir o seu período de adiamento oficial e se tornar efetiva para toda a produção nacional.

Durante a etapa de produção primária do leite, a higiene apropriada do animal, do ambiente, do e-quipamento, da sala de ordenha e da sala de resfriamento é essencial para diminuir a contaminação do produto que será obtido neste processo. Tal higiene é extremamente importante para a produção de um leite que, não somente seja capaz de responder bem aos novos requisitos legais, mas também de apresentar uma vida de prateleira adequada.

Os microorganismos psicrotróficos são bactérias encontradas no solo, na superfície de plantas, em animais e nos próprios equipamentos utilizados na fazenda ou mesmo na indústria para o transporte de leite cru. Eles são capazes de crescer a temperaturas que variam de 0 a 40oC e possuem uma temperatura ótima de crescimento a 25oC. A capacidade destes microorga-nismos de crescer entre  4oC e  10oC é um desafio para a cadeia de frios do setor como um todo, pois trata-se de um grupo de bactérias diretamente relacionadas à qualidade do produto final na indústria de laticínios moderna.

Outro fator importante é a correta manutenção do e-quipamento de ordenha com a calibragem periódica da ordenhadeira de acordo com a recomendação do fabricante. Esta manutenção será de extrema importância para evitar que, ao ordenhar, ar seja sugado para a linha, contaminando o leite. Teteiras mal acopladas estão propensas a se desprender e cair, se tornando fontes de contaminação da glândula. Outra possibilidade é que altas pressões sejam capazes de propiciar a introdução de microorganismos que estejam contaminando a teteira no interior dos tetos,  iniciando assim o processo de mastite.

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Na agroindústria

Na indústria laticinista, o leite não sofrerá nenhuma alteração físico-química capaz de melhorar sua qualidade final. Os tratamentos térmicos terão somente a função de estender a estocagem do produto a um período, dependente da condição higiênica do leite apresentada no ato de seu recebimento pela agroindústria. No laticínio, o leite deverá ser avaliado e seu fim será julgado de acordo com as características de conservação demonstradas naquele momento.  Além da degradação protéica e lipólise, já realizadas pela flora colonizadora do mesmo, este leite também poderá conter enzimas capazes de resistir ao tratamento térmico.

Usualmente, as bactérias psicrotróficas são as grandes responsáveis pela produção de  enzimas termo-estáveis e, portanto, a sua presença deve ser evitada ao máximo no leite fluído. Apesar de serem sensíveis aos tratamentos térmicos, as suas enzimas proteolíticas e lipólíticas sobrevivem ao calor, causando defeitos em leites fluídos. As proteases ou enzimas proteolíticas atacam principalmente a β-caseina e a  κ-caseina levando a uma maior viscosidade do leite e ao desenvolvimento de sabores amargos. As lípases ou enzimas lipolíticas têm como substrato os triglicerídeos que compõe 98%  da gordura do leite.  Para agravar ainda mais o processo, há também uma maior disponibilidade das gorduras, que após passarem pela homogeneização e pelos tratamentos témicos, perdem a proteção dos glóbulos ao romper-se e reconstituir-se em glóbulos menores de gordura. Assim, ficam mais susceptíveis à ação das lipases, que liberam ácidos graxos, responsáveis pelo aparecimento do gosto característico de rancificação.

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No mercado varejista

Nas geladeiras e nas gôndulas não refrigeradas, que irão armazenar respectivamente o leite pasteurizado e o leite longa vida, é preciso que o produto encontre um ambiente adequado. As superfícies devem ser apropriadamente higienizadas evitando que derramamentos acidentais contaminem a embalagem externa. As áreas de exposição devem ser livres de materiais cortantes e superfícies irregulares que possam danificar a embalagem e submete-la a contaminação microbiana. Nesta etapa, qualquer contaminação do produto é extremamente importante e determinante do efeito sanitário deste para o consumidor, principalmente porque este leite poderá ser consumido diretamente, sem nenhuma outra etapa capaz de eliminar este contaminante inesperado.

A temperatura preconizada para a esto-cagem de leite pasteurizado no ponto de venda é, com certeza, essencial para uma boa vida de prateleira para o produto final.  Esta temperatura é de até 10oC para leite fluído, sendo 4oC o ideal.

O grande problema em relação à temperatura é a falta de constância, como relata um trabalho de monitoramento de gôndolas de comercialização de leite na cidade de Juiz de Fora. O trabalho mostrou que 66% dos estabelecimentos apresentavam temperaturas não conformes à estocagem do leite sob refrige-ração.

Ainda no mercado varejista, para que se evite a oxidação no caso do leite envasado em recipientes pouco restritivos quanto à entrada de luz, como os saqui-nhos de polietileno, é essencial que o armazenamento seja feito em refrigeradores fechados, com pouco contato com a luz artificial das padarias e mercados. Este contato direto com a luz produ-zirá oxidação de parte da gordura do leite e conseqüente alteração do sabor, que assemelha-se ao de penas cozidas. A exposição à luz é capaz ainda de causar a degradação da vitamina A, que ocorre de forma mais rápida em leites desnatados e semi-desnatados do que no leite integral.

 

Conclusão

A produção brasileira de leite e derivados padece do mesmo mal que toda a cadeia de produção agropecuária. A interdependência entre os diversos elos produtivos é extremamente importante para a obtenção de um produto final de qualidade.  Sem uma ação conjunta, é pra-ticamente impossível mudar a vida útil e o tempo de prateleira de leites tratados termicamente no Brasil. •

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