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Animais Jovens, Manejo, Nutrição

Alimentação e produtividade das futuras fêmeas leiteiras

Apostar no fornecimento elevado de nutrientes durante a fase de aleitamento é a estratégia mais assertiva para garantir longevidade e alta produtividade das futuras fêmeas leiteiras.

Alimentação e produtividade das futuras fêmeas leiteiras

A sobrevivência de bezerras e novilhas de reposição, bem como a subsequente sobrevivência de vacas leiteiras a cada lactação e a conversão eficiente do alimento em leite contribuem, sem exceção, para o sucesso da atividade e, até mesmo, para a sustentabilidade do sistema leiteiro. Nesse contexto, o aumento do volume de leite fornecido na fase de cria, em detrimento aos planos de aleitamento restritivos, tem apresentado correlação causal positiva sobre o crescimento e a produção futura das fêmeas leiteiras. 

De fato, no período crítico do início da vida, a nutrição e os outros fatores ambientais desencadeiam a plasticidade do desenvolvimento do animal, o qual leva ao fenótipo adulto alterado. Embora esse conceito seja amplamente estudado em outras espécies (por exemplo, seres humanos, ratos e suínos), o modo de ação subjacente desses efeitos é pouco compreendido em ruminantes.

Pesquisadores sugeriram que o desenvolvimento precoce dos órgãos poderia explicar esses efeitos sobre a produção de leite. Por essa razão, o fornecimento restritivo (ou convencional) de leite foi comparado ao esquema de aleitamento intensivo (volume elevado de leite). As bezerras envolvidas nessa pesquisa foram abatidas aos 54 dias de vida e foi verificado que todos os órgãos (incluindo fígado, pâncreas, rins e glândulas mamária) daquelas que receberam aleitamento intensivo eram substancialmente maiores – em tamanho absoluto e em porcentagem do peso corporal – quando comparados aos das bezerras aleitadas convencionalmente (Soberon e Van Amburgh, 2017; Tabela 1).  


Tabela 1. Médias dos pesos corporais iniciais e finais (kg) e dos pesos dos órgãos, absolutos (g) e relativos aos pesos corporais (%), de bezerras aleitadas de acordo com plano restritivo (n = 6) ou elevado (n = 6), do nascimento aos 54 dias de vida

Adaptado de Soberon e Van Amburgh (2017) 

Em outros estudos, foi reportado que bezerras sob fornecimento elevado de leite apresentaram diferenças em parâmetros metabólicos, ilustrados por perfis de expressão gênica e análises de vias metabólicas em tecidos selecionados (Figura 1). Por meio da análise de perfis transcriptômicos, foi revelado que a alimentação com volume elevado de leite provocou grandes mudanças nos perfis de expressão gênica associados aos processos do ciclo celular (como mitose e apoptose), ao desenvolvimento de órgãos e ao metabolismo dos tecidos (Leal et al., 2016, 2017 a, b, 2018; Romão et al., 2018; Hare et al., 2019). Ainda, foi ressaltado que o fornecimento de nutrientes durante o aleitamento impactou o metabolismo e o desenvolvimento em curto prazo de bezerras, o que, potencialmente, repercute na idade adulta.


Figura 1:  Alterações nos perfis de expressão gênica de bezerras aleitadas de acordo com plano restritivo (n = 6) ou elevado (n = 6) de nutrientes, do nascimento aos 54 dias de idade.

 Adaptada de Leal et al. (2016; 2017a, b; 2018); Romão et al. (2018) e Hare et al. (2019).

Para investigar o tema, nosso grupo de pesquisa caracterizou o crescimento, o metabolismo e o desempenho durante a lactação de fêmeas que foram alimentadas de acordo com esquema restritivo ou elevado na fase de aleitamento (Leal et al., 2021). As 86 bezerras da raça Holandês incluídas no estudo receberam o mesmo volume de colostro, tinham acesso livre à água e, a partir do quarto dia, ao concentrado inicial e ao feno. Exceto pelo volume de sucedâneo lácteo fornecido, os grupos experimentais foram igualmente manejados. Ambos foram alimentados com sucedâneo lácteo, diluído em água, na concentração de 150 g/L, porém o grupo LifeStart recebeu 8 litros por dia, enquanto o grupo controle recebeu 4 litros por dia. Conforme protocolo padrão, todas foram desaleitadas aos 56 dias de vida. A partir do dia 70, foram transferidas para alojamentos coletivos e, quando atingiram peso corporal de 390 kg, foram inseminadas. Após o parto, os animais foram introduzidos nas instalações do rebanho leiteiro do centro de pesquisa, onde foram alimentados de acordo com dieta estrategicamente formulada para o experimento. 

Os métodos para obtenção de dados no experimento incluíam mensuração periódica do peso corporal; coletas estratégicas de sangue para posteriores análises de metabólitos; mensuração do consumo alimentar e da produção de leite; análise da composição do leite e determinação do escore de condição corporal (ECC). 

Durante o período de aleitamento, as bezerras submetidas ao plano alimentar elevado apresentaram maior ganho médio diário (794 versus 539 g/d; P < 0,01; Figura 2), o que resultou em 10,5 kg de diferença de peso ao desaleitamento.

Figura 2:  Ganho médio diário (GMD; kg/dia) de bezerras leiteiras (n = 86) aleitadas de acordo com plano restritivo (em vermelho) ou elevado (em azul). Os asteriscos indicam diferença estatística entre os grupos. As barras verticais indicam erro padrão.  

Adaptada de Leal et al. (2021).

De acordo com a análise metabolômica, no dia 49 de vida das bezerras, 46% dos metabólitos sanguíneos estavam em concentrações significativamente diferentes entre os grupos. Alterações nos metabolismos energético (ácidos graxos e metabólitos do ácido tricarboxílico), proteico (aminoácidos livres, dipeptídeos e ciclo da ureia) e hepático (ácidos biliares e molécula heme) foram os principais efeitos associados aos diferentes aportes nutricionais fornecidos às bezerras. 

As diferenças no perfil metabólico identificadas entre os grupos refletem as amplas diferenças na ingestão de nutrientes, de forma que podem apontar quais processos metabólicos são responsáveis pelo maior desempenho produtivo das vacas que receberam maior volume de leite durante a fase de aleitamento.

Conforme apontado nos resultados, o desempenho na lactação foi significativamente afetado pela nutrição recebida no início da vida do animal. As vacas que foram alimentadas de acordo com o plano elevado na fase de aleitamento produziram mais gordura na primeira (+ 83 g/ dia; P < 0,01) e segunda (+ 72 g/dia; P = 0,04) lactações, o que resultou em maiores produções de leite corrigido para gordura e proteína, também na primeira (+ 0,9 kg/d; P < 0,01) e segunda (+ 1,3 kg/d; P = 0,12) lactações. Já as bezerras submetidas ao aleitamento restritivo, quando chegaram ao parto, estavam mais gordas – e assim permaneceram durante a primeira (+ 0,09 pontos de ECC; P < 0,01) e segunda (+ 0,13 pontos de ECC; P = 0,08) lactações.

Os resultados sugerem que esses animais distribuíram de forma diferente a energia entre as reservas corporais e a produção de leite. As análises metabolômicas do sangue coletado aos 49 e 330 dias de vida, bem como aos 60 dias de lactação, parecem confirmar a diferença no metabolismo da gordura. Apesar de hipotética, a maior taxa de sobrevivência registrada nas três primeiras lactações das vacas que receberam níveis elevados de nutrientes durante o aleitamento pode estar relacionada ao metabolismo energético aprimorado, uma vez que o metabolismo da gordura durante o início da lactação é um dos principais aspectos associados à saúde e longevidade das vacas (Figura 3). 

Figura 3:  Gráfico e resumo estatístico da análise de sobrevivência das fêmeas leiteiras (n = 83) que foram aleitadas de acordo com plano restritivo (em vermelho) ou elevado (em azul) de nutrientes. 

Leal et al. Não publicado. 

Diante de tudo o que foi exposto, é possível perceber que, ao criar novilhas de reposição, os objetivos devem ser o abandono da busca por custos mais baixos e o fornecimento suficiente de nutrientes, para cumprir as metas de ganho de peso e desenvolvimento corporal da categoria. As novilhas são o futuro das propriedades leiteiras, portanto, apostar alto no desempenho de animais saudáveis e resilientes é a melhor estratégia para produzir leite com eficiência e ter sustentabilidade na atividade.


REFERÊNCIAS 

Soberon, F. and M. E. Van Amburgh. 2017. Effects of preweaning nutrient intake in the developing mammary parenchymal tissue. Journal of Dairy Science 100(6): 4996- 5004. 

Leal, L. N., G. J. Hooiveld, M. A. Steele, M. V. Boekschoten, F. Soberon, M. E. Van Amburgh and J. Martín-Tereso. 2016. Effect of nutrient supply on mammary gland development and gene expression in pre-weaned calves. Book of abstracts of the 67th Annual Meeting of the European Federation of Animal Science 22: 279-279. 

Leal, L. N., G. J. Hooiveld, F. Soberon, H. Berends, M. V. Boekschoten, M. A. Steele, M. E. Van Amburgh and J. Martín-Tereso. 2017a. Neonatal nutrient supply affects pancreatic development in Holstein calves. Book of abstracts of the 68th Annual Meeting of the European Federation of Animal Science 23: 387-387. 

Leal, L. N., G. J. Hooiveld, F. Soberon, H. Berends, M. V. Boekschoten, M. A. Steele, M. E. Van Amburgh and J. Martín-Tereso. 2017b. Pre-weaning nutrient supply affects gene expression profi les in bone marrow and muscle in calves. Book of abstracts of the 68th Annual Meeting of the European Federation of Animal Science 23: 447-447. 

Leal, L. N., J. M. Romao, G. J. Hooiveld, F. Soberon, H. Berends, M. V. Boekshoten, M. E. Van Amburgh, J. Martín-Tereso and M. A. Steele. 2018. Nutrient supply alters transcriptome regulation in adipose tissue of pre-weaning Holstein calves. PLOS ONE 13:e0201929. 

Romao, J., L. Leal, G. Hooiveld, F. Soberon, H. Berends, M. Boekschoten, M. Van Amburgh, J. Martín-Tereso and M. Steele. 2018. Nutrient supply alters adipose tissue physiology in pre-weaned calves. Journal of Animal Science 96(3): 417-417. 

Hare, K. S., L. N. Leal, J. M. Romao, G. J. Hooiveld, F. Soberon, H. Berends, M. E. Van Amburgh, J. Martín-Tereso and M. A. Steele. 2019. Preweaning nutrient supply alters mammary gland transcriptome expression relating to morphology, lipid accumulation, DNA synthesis, and RNA expression in Holstein heifer calves. Journal of Dairy Science 102:2618-2630. 

Leal, L. N, J. Doelman, B. R. Keppler, M. A. Steele and J. Martín-Tereso. 2021. Preweaning nutrient supply alters serum metabolomics profi les related to protein and energy metabolism and hepatic function in Holstein heifer calves.  


 


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