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Avaliação da qualidade e composição do colostro

Avaliação da qualidade e composição do colostro

Não é novidade alguma que o colostro é essencial para os bezerros recém-nascidos, fornecendo anticorpos (imunoglobulinas - IgG) que os protegem contra infecções. Entretanto, os resultados de levantamentos de pesquisa sobre a qualidade do colostro mostram uma enorme variação em parâmetros como: concentração de IgG, níveis de gordura e proteína, e contaminação bacteriana, colocando os bezerros em grande risco de falhas na transferência de imunidade passiva.

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Introdução

As imunoglobulinas (IgG) colostrais são essenciais para assegurar a adequada transferência de imunidade passiva entre a vaca e o bezerro, uma vez que o tipo de placenta dos ruminantes não permite a passagem de anticorpos entre a mãe e o feto durante a gestação. Assim, recomenda-se o fornecimento de 2 litros de colostro de alta qualidade (mais de 50 mg de IgG/mL) nas primeiras 2 horas após o nascimento e mais 4 litros nas próximas 22 horas, totalizando 6 litros nas primeiras 24 horas de vida dos bezerros.

Entretanto, a contaminação bacteriana do colostro pode afetar a eficiência da colostragem, uma vez que as bactérias podem se ligar às IgG livres presentes no lúmen intestinal, bloqueando sua absorção. A inadequada higienização dos tetos para a ordenha, recipientes de estocagem, baldes e mamadeiras contaminados, e excesso de tempo entre a ordenha e o fornecimento do colostro fresco são as principais formas de aumento da contagem bacteriana. Para que se tenha uma idéia, um colostro fresco contém, em média 20.000 ufc de E.coli/mL. Se o mesmo for deixado em temperatura ambiente, essa contagem pode dobrar a cada duas horas.  Assim, a recomendação atual é que se descarte colostros que contenham menos de 50 mg de IgG/mL e/ou contagem bacteriana total superior a100.000 ufc/mL.

Carboidratos, gorduras, proteínas, vitaminas e minerais presentes no colostro são também fontes vitais de energia, aminoácidos, cofatores para enzimas e outras funções do organismo.

O bezerro recém-nascido possui reservas muito pequenas de energia, com os lípides representando apenas 3% do seu peso vivo. Além disso, grande parte desses lípides são estruturais (presentes em órgãos e tecidos), não contribuindo para o suprimento de energia do animal. Assim, os bezerros dependem da gordura e lactose presente no colostro como fonte de energia para termogênese (produção de calor) e manutenção da temperatura corporal. Sabe-se que o colostro possui um conteúdo energético superior ao do leite, mas o mesmo pode variar muito entre diferentes colostros.

As proteínas não-imunoglobulinas são essenciais para o crescimento e diferenciação de vários tecidos e órgãos no organismo dos bezerros recém-nascidos, além de facilitar a assimilação de outros nutrientes. Assim como o conteúdo de gordura, apresentam grandes variações quando se comparam diferentes colostros.

O objetivo desse artigo é  apresentar as variações, obtidas em levantamentos de pesquisa, nas concentrações de IgG, nutrientes e contaminação bacteriana de colostros coletados e estocados em fazendas produtoras de leite.

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Avaliação de colostros nos EUA

O Journal of Dairy Science publicou em julho desse ano um levantamento conduzido nos EUA com o objetivo de avaliar a qualidade imunológica, microbiológica e nutricional de colostros produzidos em várias regiões do país, e submetidos a diferentes métodos de estocagem.

Nesse trabalho, foram coletadas 827 amostras de colostro provenientes de 67 fazendas, localizadas em 12 estados, entre junho e outubro de 2010. Do total de amostras, 479 foram provenientes de vacas Holandesas, 87 de Jerseys, 7 de cruzamentos e 239 de raças indefinidas. Quarenta e nove vacas do levantamento estavam em sua primeira lactação, 174 na segunda, 128 com três ou mais, e 476 não tinham dados de número de lactações. Nenhuma das propriedades utilizava a pasteurização do colostro. 

Todas as amostras foram avaliadas para concentração de IgG, gordura, proteína, sólidos totais, contagem de células somáticas (CCS) e contagem bacteriana total (CBT), conforme pode ser observado na Tabela 1.

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Pelos dados da tabela é possível observar a grande variação na composição das amostras de colostro. A gordura apresentou a maior variação média, de 57% entre as amostras, seguida da concentração de IgG, com 48% de variação.

 

Qualidade dos colostros

 

Imunoglobulinas

Muitos fatores, como o volume de colostro produzido, o número de lactações da vaca, a duração do período seco, as vacinações, dentre outros, podem afetar a concentração de IgG do colostro, explicando a grande variação observada nesse levantamento.

A recomendação atual é que se descarte colostros que contenham menos de 50mg de IgG/mL. No levantamento americano, 29,4% das amostras apresentaram concentrações inferiores a essa recomendação (Tabela 2), colocando cerca de 30% dos bezerros nascidos nos EUA em risco de apresentarem falhas na transferência de imunidade passiva. Outro levantamento, feito na Noruega, relatou que 57,8% das amostras de colostro avaliadas apresentavam menos de 50 mg de IgG/mL.

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Em outro estudo, conduzido em 12 rebanhos na região de Wisconsin/EUA, as 239 amostras de colostro avaliadas apresentaram média de 76,7mg de IgG/mL, com variação de 9,4 a 185,7 mg/mL.

Outro trabalho recente  relatou um valor médio de 70,3 mg de IgG/mL, com variação de 35,8 a 124,2 mg/mL, em 22 amostras analisadas.

 

Contaminação bacteriana

Um segundo parâmetro de avaliação da qualidade de colostros é a contaminação bacteriana. Como dito anteriormente, altas contagens bacterianas podem levar a uma redução na absorção de IgG, reduzindo a eficiência da colostragem, mesmo quando se fornece colostro com mais de 50mg de IgG/mL.

No levantamento americano, mais de 50% das amostras avaliadas apresentaram CBT inferior a 100.000 ufc/mL. Entretanto, 27% dessas apresentaram valores superiores a 500.000 ufc/mL (Tabela 3), colocando os bezerros em uma situação de alto desafio imunológico, seja pela quantidade de bactérias ingeridas ou pela interferência na absorção das IgG que deveriam protegê-los contra as infecções nessa fase inicial de suas vidas.

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Regionalmente, a região sudeste dos EUA apresentou a maior média para CBT, bem como o maior número de amostras contendo valores superiores a 100.000 ufc/mL. Segundo os autores, essa observação deve-se ao clima quente e úmido da região, favorecendo o crescimento bacteriano. Essa condição climática é típica de grande parte do Brasil, fazendo com que essa realidade, certamente, esteja presente nas propriedades brasileiras.

Sabe-se que a refrigeração ou congelamento do colostro, logo após sua coleta, diminuem o ritmo de crescimento bacteriano, sendo recomendada a refrigeração quando o mesmo for fornecido em até 24 horas após a coleta, ou o congelamento para períodos superiores de estocagem. Entretanto, um levantamento feito pelo National Animal Health Monitoring System (NAHMS, 2007) constatou que 60,7% do colostro americano é fornecido fresco ou estocado sem refrigeração.

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No levantamento feito nos EUA, mais de 60% das amostras submetidas à refrigeração ou congelamento após a coleta, apresentaram CBT inferior a 100.000 ufc/mL. Entretanto, mais de 40% das amostras refrigeradas apresentaram CBT superior a 1 milhão de ufc/mL (Tabela 4). Segundo os autores, isso pode ter ocorrido em função de altas temperaturas ambientais antes da estocagem, de um longo período de tempo entre a coleta e a refrigeração, da velocidade da refrigeração, e do tempo entre a retirada da refrigeração e o fornecimento aos bezerros.  Ou seja, mesmo um colostro de alta qualidade imunológica (mais de 50mg de IgG/mL) e baixa CBT (menos de 100.000 ufc/mL) pode ser ineficiente em promover uma adequada transferência de imunidade passiva, além de poder representar uma fonte de infecção para os bezerros, em função do crescimento bacteriano pós-coleta.

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Embora uma grande porcentagem de amostras tenha apresentado valores adequados de IgG (70,6%) ou de CBT (54,8%), pouco mais de 40% mostraram-se adequadas em relação aos dois parâmetros (Tabela 5), colocando aproximadamente 60% dos bezerros nascidos nos EUA em risco de falhas na transferência de imunidade passiva.

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Com relação aos gêneros de bactérias presentes no colostro, um estudo realizado no Brasil, no Estado do Rio Grande do Sul, encontrou as seguintes ocorrências e frequências: Lactobacillus spp e Staphylococcus spp (100% das amostras); Escherichia spp (74% das amostras); Streptococcus spp (7,4% das amostras); Klebsiela spp,  Bacillus spp e Serratia spp (1,85% das amostras, cada). Também foram isolados fungos leveduriformes em 1,85% das amostras.

 

Qualidade nutricional

Como mostrado na Tabela 1, o conteúdo de gordura nos colostros apresentou enorme variação (1 a 21,7%) no levantamento americano. O baixo conteúdo de gordura afeta a sobrevivência dos bezerros recém-nascidos, uma vez que possuem baixas reservas de energia, na forma de lípides (380 a 600g) e de glicogênio (180g).

A lactose é o principal carboidrato presente no colostro e leite, fornecendo cerca de 3,95 kcal/g. Trabalhos recentes mostram que as concentrações de lactose aumentam durante as 3 primeiras ordenhas pós-parto, alcançando valores médios de 2,7; 3,9 e 4,4%, respectivamente. Outro estudo mostrou que esse aumento ocorre até 30 dias pós-parto. No levantamento americano, a lactose foi o componente que apresentou menor variação nos colostros avaliados.  As baixas concentrações observadas em algumas amostras estão relacionados com a alta CBT das mesmas, uma vez que as bactérias utilizam a lactose como substrato energético.

As proteínas são o terceiro grupo de nutrientes presentes no colostro que podem servir como fonte de energia (5,6 kcal/g) para os bezerros recém-nascidos, embora sejam mais importantes para o desenvolvimento estrutural dos mesmos. O colostro contém maior teor de proteína que o leite (14 vs. 3,2%), sendo que grande parte é composta de IgG.  As concentrações de proteína apresentam rápido declínio nos primeiros dois dias após o parto, caindo de forma contínua até 30 dias pós-parto. Como mostrado na Tabela 1, o conteúdo médio de proteína no levantamento americano foi de 12,7%, com uma variação média de 26% entre as amostras. O método de conservação do colostro foi responsável por variações no conteúdo de proteína, sendo maior em amostras refrigeradas ou congeladas quando comparadas com as frescas.

 

Contagem de células somáticas

Novos casos de mastite podem ocorrer durante o período seco, afetando a qualidade do colostro. Uma observação interessante é que valores de CCS superiores a 50.000 céls/mL (log CCS = 4,7) estão relacionados com a produção de colostro com baixas concentrações de IgG (menos que 30 mg/mL). No levantamento americano, todas as amostras de colostros que apresentaram menos de 25 mg de IgG/mL tiveram alta CCS (superior a log CCS = 5,6).

 

Suplementos e substitutos de colostro

Em situações nas quais apenas colostro de baixa qualidade esteja disponível, a utilização de suplementos e substitutos de colostro podem ser uma alternativa para evitar as falhas na transferência de imunidade passiva. Esses produtos também podem ser usados para evitar a transmissão de vários patógenos via colostro, incluindo Mycobacterium avium ssp. paratuberculosis (MAP), Salmonella dublin e Mycoplasma bovis.

Os suplementos de colostro são produtos que fornecem menos de 100g de IgG/dose, sendo destinados apenas para a suplementação do colostro já existente, não sendo recomendados para substituir o mesmo. Por outro lado, os substitutos de colostro contêm valores superiores a 100g IgG/dose, além de fornecerem outros nutrientes, como carboidratos, proteína, gordura, vitaminas e minerais exigidos pelo neonato, sendo utilizados como substituto completo do colostro materno.

Um estudo recente, conduzido nos EUA com 497 animais de 12 rebanhos, mostrou que a utilização de substitutos de colostro foi uma alternativa eficiente para a colostragem em vários rebanhos leiteiros. Os animais foram acompanhados por 54 meses e comparados ao grupo que recebeu colostro verdadeiro. Os animais adultos do grupo que recebeu o substituto não apresentaram diferença quanto à produção de leite/lactação, desempenho na reprodução e risco de abate ou morte quando comparados aos animais do grupo que recebeu colostro materno. Além disso, as bezerras do grupo que recebeu o substituto apresentaram menor incidência de infecções causadas por Mycobacterium avium ssp. Paratuberculosis que os animais do grupo que recebeu colostro verdadeiro. 

 

Conclusões

Os resultados de levantamentos de pesquisa sobre a qualidade do colostro mostram uma enorme variação em parâmetros como: concentração de IgG, níveis de gordura e proteína, e contaminação bacteriana, colocando os bezerros em grande risco de falhas na transferência de imunidade passiva.

Além de cuidados com a nutrição e sanidade da vaca no período seco, e um adequado manejo de coleta, estocagem e fornecimento do colostro, a utilização de suplementos e substitutos de colostro é uma nova ferramenta, que está entrando agora no mercado brasileiro, e que pode auxiliar na redução das falhas na transferência de imunidade passiva e na transmissão de doenças.

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