A casa das grandes mães: conheça a história das Fazendas do Basa
O projeto de criação de Gir Leiteiro implementado pelas Fazendas do Basa vai além da contribuição genética para a raça; ele promove a democratização do acesso às melhorias genéticas, com o intuito de elevar o padrão da pecuária leiteira nacional.
A máxima “Para produzir um Girolando excepcional, somente com um Gir Leiteiro igual” só pode ser lida (e entendida) na voz de seu autor: Sr. Evandro do Carmo Guimarães, proprietário das Fazendas do Basa e presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Gir Leiteiro (ABCGIL). Com voz grave, fisionomia altiva e olhar focado, Sr. Evandro conhece profundamente o setor e tem contribuído diretamente para o desenvolvimento da pecuária leiteira.
A honra de ter a trajetória do Sr. Evandro contada nas páginas da Revista Leite Integral se solidifica no tom honesto da narrativa, na robustez dos conhecimentos sobre genética e reprodução das raças tropicais Gir Leiteiro e Girolando e na potência da certeza do perfil transformador da pecuária de leite tropical.
Com a palavra, Sr. Evandro do Carmo Guimarães!
Como tudo começou
Por que existe a marca Fazendas do Basa? A resposta a essa pergunta poderia ter sido repleta de números, resultados de investimentos ou até mesmo baseada nos inúmeros artigos que o Sr. Evandro do Carmo Guimarães cita sem a necessidade de consultar nenhum documento. No entanto, veio singela, típica daqueles que prestam atenção na vida. Por esse motivo, o longo trecho segue entre aspas.
“Desde os 20 anos sou criador de Girolando, pois já tinha algum recurso e uma pequena propriedade, próxima da Fazenda do meu avô. Naquela época, há 59 anos, Girolando era chamado de mestiço, não tinha nome bem determinado. Como criador, sempre me preocupei em ter o melhor gado de leite.
Meu avô materno era um pequeno produtor de leite em Muriaé/MG. Assim como o meu pai, ele me inspirava. Da varanda da sua fazenda antiga e rústica, a qual ainda existe, eu via chegar o caminhão que recolhia o leite. O caminhão parava e ficava esperando o leite da vizinhança, que chegava em carrocinha de bode, em carrinho de mão, em charretes com burricos, etc. Vários produtores traziam pequenas latas de leite, de 20 kg ou 30 kg.
Os filhos dos pequenos produtores eram os meus principais amigos durante minhas férias escolares, porque era com eles que eu jogava bola nos campinhos em torno da fazenda do meu avô.
Essas são as memórias que me deram motivação social importantíssima a vida inteira, porque eu comecei a perceber que muitos deles se tornaram médicos, arquitetos, engenheiros, médicos veterinários ou zootecnistas. Mesmo com a pequena produção do pai e do avô no interior, especialmente em Minas Gerais, muitas milhares de pessoas foram às universidades ou fizeram curso técnico, sustentados pela pequena produção de leite.”
Depois de uma vida profissional de sucesso no setor de tecnologia e telecomunicações, Sr. Evandro, quando se aposentou, decidiu se dedicar inteiramente à melhoria da genética do gado de leite. O motivo? “Essa é uma contribuição social que posso dar, muito objetiva, e da qual eu tenho muita convicção.”
As Fazendas do Basa
Foi dos campos de futebol que o Sr. Evandro recebeu o apelido “Basa”, uma referência a Ari Bazão, marcante zagueiro que defendeu o Corinthians nos anos 1980 e 1990. Com sua estatura imponente e força, o jogador se destacava como barreira para os atacantes adversários. Tais características também foram atribuídas ao Sr. Evandro durante as partidas de futebol entre amigos; características especialmente destacadas por seu 1,90 m de altura. O nome das Fazendas é derivado desse apelido.
Otimizando a gestão e a sinergia entre as diferentes operações, as propriedades que formam as Fazendas do Basa incluem: a Fazenda das Palmeiras; a Fazendinha Chico Dama e a Fazendinha Maria do Luxo, hoje concentradas no município de Muriaé; a Fazenda das Boas Lembranças, em Leopoldina; e a Fazenda Cachoeira da Esperança, em Cataguases.
Como criador de gado, Sr. Evandro afirma que errou muito, em especial, quando começou, há 40 anos. Naquela época, para uma das fazendas localizadas em Muriaé/MG, comprou animais da raça Gir Padrão, ou seja, animais com dupla aptidão. Ele explica: “O Gir Padrão é uma contradição que se encontra no início da proposta. Quando o Gir é destinado para a produção de carne, o ideal é abatê-lo aos 20 meses. Se for destinado para a produção de leite, o ideal é que produza em mais de uma década”.
Com esses animais, passou a trabalhar acasalamentos. “Passei a produzir Girolando com vários graus de sangue. Inclusive, importei embriões do Canadá e dos Estados Unidos para ter animais de qualidade de cobertura, porque naquele tempo era mais difícil fazer inseminação. Mas o Gir daquela época não dava leite. Tinha as características típicas da raça indiana.”
O momento da virada na produção foi quando Sr. Evandro colocou em pauta a discussão sobre uma certeza que existia no Brasil – a de que o mais importante era a genética do touro. Segundo Sr. Evandro, “Isso nunca foi verdade! Os genes têm que ser combinados; e os da família materna são tão importantes ou, como muitos pesquisadores confirmam, muito mais importantes que os dos machos para a produção de animais leiteiros”.
A partir dessa percepção, partilhada e incentivada pelo saudoso médico veterinário Dr. Luiz Ronaldo de Paula, foram feitos vários leilões, de onde saíram inúmeros caminhões carregados de animais da raça Girolando para diversas regiões do Brasil. Com o tempo, Sr. Evandro começou a notar e a pesquisar um tipo de Gir muito raro e caro: o Gir Leiteiro. E esse foi o seu maior acerto.
Melhoramento genético com foco nas famílias
Considerar a linhagem e a ascendência dos animais, em vez de se concentrar exclusivamente no sucesso individual de touros ou vacas, é mais do que estratégia para as Fazendas do Basa: trata-se de uma filosofia.
Sr. Evandro acredita que, embora muitas vezes não praticada, o foco na família dos animais é fundamental nos estudos sobre melhoramento genético. “O sucesso individual pode concentrar a atenção para um único animal, sem considerar sua ascendência. Se existe uma justaposição de genes provocado por um acidente biológico favorável, isso é capaz de gerar uma família com características de alta reprodutividade e alta produção de leite. Então, nunca é um animal isoladamente; é a família”, explica ele.
Selecionando as vacas das melhores famílias, das melhores fazendas, Sr. Evandro encontrou aquela que mudaria a história das Fazendas do Basa. Ele mesmo conta essa história: “Faço questão de citar o médico veterinário Simeão Feres Neto. Ele foi à Fazenda Brasília verificar os animais que eu estava comprando e chamou sua atenção uma bezerra chamada Fábrica FIV de Brasília. Sou muito grato a ele pela sensibilidade de perceber esse animal, embora só se entenda seu valor depois da progênie. Não adianta o animal só produzir muito leite. Ele tem que produzir filhas que também produzam muito leite”.
A partir desse fato genético espetacular, as Fazendas do Basa comercializaram o que se revelou ser seu ativo mais valioso. “Com a abundância de descendentes da Fábrica na minha fazenda, iniciei a venda das suas filhas, contribuindo para a diversificação e o enriquecimento genético em várias outras fazendas. De fato, ela foi responsável pela produção de mais de 40 filhas diretamente sob meus cuidados. Essa ação de democratização, da qual me orgulho, permitiu que muitas fazendas melhorassem significativamente a qualidade de seu rebanho leiteiro. A contribuição desses animais – filhas ou netas da Fábrica – transcendeu os limites da minha propriedade, embora eu não tenha um levantamento exato do número de seus descendentes produzidos. Esse legado genético não apenas ampliou o escopo da excelência leiteira, mas também fortaleceu a conexão entre diversas fazendas por meio do compartilhamento de uma linhagem excepcional.”
Sr. Evandro negociou a venda de 50% da participação na vaca Fábrica FIV de Brasília para o saudoso Sr. José Coelho Vitor, da Fazenda São José do Can Can, em Passos/MG, em um leilão realizado no Hotel Copacabana Palace. A parceria, assinada em 2009, estabeleceu a mudança do animal para a fazenda do comprador.
Além da família Fábrica FIV de Brasília, as Fazendas do Basa são proprietárias de animais pertencentes às principais famílias de Gir Leiteiro, das quais se destacam: Lenda, Prateada, Nagy, Quica, Heresia, Profana, Deliciosa, Edra, Lactose, Urgência, Brancura, Elite, Umidade, Fábula, Sibelinha, Ventosa, Sacada, Coraça, Bonita, Biriba, Fiara, Damini, Dádiva, Domada e muitas outras. No total, são mais de 100 filhas de vacas célebres, escolhidas pela excepcional linhagem genética e pela capacidade produtiva.
O compromisso com a melhoria da genética e a reprodução na pecuária leiteira levou Sr. Evandro a destinar anualmente pelo menos 2% do faturamento das Fazendas do Basa para pesquisas. Uma série de projetos inovadores foram desenvolvidos com a Embrapa Gado de Leite, com a Universidade Federal de Viçosa (UFV) e com a Universidade de São Paulo (USP).
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Com a abundância de descendentes da Fábrica na minha fazenda, iniciei a venda das suas filhas, contribuindo para a diversificação e o enriquecimento genético em várias outras fazendas.
Objetivos alcançados
Como resultado dos investimentos e do trabalho ao longo dos últimos 20 anos, as Fazendas do Basa se consolidaram na posição de liderança entre os Top 10% na avaliação genômica. Orgulhosamente, a marca conta com animais no exclusivo patamar de 0,1% e mais de 250 que se enquadram no Top 5% (Gráfico 1).
“Nossa liderança em avaliação genômica, que engloba dados fenotípicos e genealógicos, medições lineares e genômicas, é um marco significativo. Ser reconhecido como líder nesse campo é um grande objetivo alcançado, pois reflete a excelência e a qualidade superior de nossas fêmeas”, explica Sr. Evandro.
Além disso, em um período relativamente curto, de aproximadamente 20 anos, as Fazendas do Basa estabeleceram uma bateria de touros de primeira linha; um resultado notável. Entre eles, destacam-se: Fabuloso, Lusitano, Gim, Nóbrega e Metano, os pilares da família Fábrica.
“O sucesso que alcançamos foi resultado direto da nossa dedicação ao Gir Leiteiro, mesmo que historicamente tenhamos sido reconhecidos pela produção de Girolando ½ sangue. Quero enfatizar um princípio que se tornou nosso lema e que tem sido fundamental na nossa trajetória: para produzir um Girolando excepcional, somente com um Gir Leiteiro igual. Esse mantra consolidou nossa abordagem e foi crucial para elevar o padrão do nosso Girolando, reforçando minha identidade e meu comprometimento com essa raça”, explica ele.
É essencial reconhecer que o estabelecimento do Gir Leiteiro no Brasil é o resultado da atuação de uma tríade: o esforço de criadores visionários e obstinados que, há cerca de 50 anos, iniciaram esse trabalho pioneiro; a união e o apoio desses criadores em torno da ABCGIL; e o apoio científico e intelectual fornecido pela Embrapa Gado de Leite.
Esses indivíduos e instituições foram fundamentais para estabelecer a relevância atual do Gir Leiteiro, considerando o impacto que a genética pode ter na transformação de um setor para garantir a segurança alimentar e nutricional no país.
Para produzir um Girolando excepcional, somente com um Gir Leiteiro igual
Planos para o futuro
Os 80 anos do Sr. Evandro serão comemorados próximo do início da primavera. Mas os planos para o futuro já estão presentes faz tempo. Sem segredos, ele conta suas estratégias, sempre com o intuito de contribuir para a evolução do setor.
O plano atual visa intensificar a pressão de seleção para aprimorar a qualidade genética do rebanho, ao mesmo tempo que se propõe a redução na escala das operações. “Especificamente, está programado o encerramento das atividades na unidade de Uberaba. Já foram realizadas reduções na operação de Muriaé, concentrando esforços e recursos nas unidades de Leopoldina e Cataguases”, explica Sr. Evandro.
Essa estratégia enfatiza um enfoque cada vez maior no Gir Leiteiro, combinado à utilização exclusiva de doadoras de alta qualificação genética e genômica, superando os padrões atualmente estabelecidos. Embora o plantel de doadoras tenha alcançado anteriormente um total de 360 muito qualificadas, o objetivo é refinar esse número para aproximadamente 150 a 160, com a condição essencial de que todas as doadoras estejam, em algum tempo, dentro dos Top 5% da avaliação genômica. Tal diretriz destaca a raridade e a exclusividade da qualidade genética perseguida – uma façanha que as Fazendas do Basa já superaram com a criação de 253 animais nessa categoria.
A preservação das reservas jovens que estão no Top 5% genômico indica uma importante mudança de direção: não mais serão vendidos esses animais de elite, como era prática comum anteriormente. Tradicionalmente, a venda dos melhores animais genômicos visava tanto à geração de receita quanto à manutenção de uma filosofia que não priorizava exclusivamente a avaliação genômica. No entanto, com os avanços na ciência, surge a necessidade de um foco renovado.
Nesse contexto, volta a ser necessária a aquisição de animais e embriões de Gir Leiteiro de destaque. Essa abordagem reflete a decisão de investir em animais no ápice da qualidade genética, mesmo que isso implique um número reduzido de doadoras. Para equilibrar, planeja-se ampliar e padronizar o número de receptoras, escolhendo especificamente fêmeas F1 – provenientes do cruzamento entre Black Angus e Nelore ou Black Angus e Brahman –, baseado na experiência positiva de reprodução.
Além disso, há uma iniciativa para aprofundar o conhecimento sobre os resultados fenotípicos, genéticos e genômicos dos animais vendidos pelas Fazendas do Basa, considerando que já foram comercializados mais de 2 mil animais de elite. “Vamos lançar um plano de incentivo à comunicação de informações oficiais sobre esses animais, oferecendo um bônus que pode ser utilizado em futuros leilões ou na compra de sêmen ou embriões. Esse esquema, já preparado para implementação, aguarda apenas uma oportunidade para ser lançado”, explica ele.
Esse esforço visa não apenas enriquecer o banco de dados com informações preciosas sobre o desempenho dos animais vendidos, mas também fortalecer a relação com os compradores, promovendo um círculo virtuoso de compartilhamento de informações e benefícios mútuos. A iniciativa de coletar tais dados de forma sistemática é um passo adiante para compreender melhor e reconhecer o sucesso da genética fornecida ao mercado.
Outra estratégia a ser mencionada: está em processo a conversão de parte significativa do estoque de sêmen convencional de touros de elite, que não disponibiliza opção sexada, para sêmen sexado.
Outra estratégia a ser mencionada: está em processo a conversão de parte significativa do estoque de sêmen convencional de touros de elite, que não disponibiliza opção sexada, para sêmen sexado. Essa transformação demanda investimento, já que é preciso sete doses de sêmen convencional para produzir uma dose de sexado. O objetivo dessa estratégia é incrementar a produção de fêmeas, uma vez que o uso de sêmen sexado modifica a distribuição convencional: de 50% para cada sexo para 90% de fêmeas e 10% de machos.
Entre os touros escolhidos para essa conversão, figuram nomes notáveis como Teatro da Silvânia, Fabuloso, Modelo de Brasília e Lusitano do Basa. Especialmente para o Lusitano do Basa, o investimento necessário será substancial, considerando que serão utilizadas sete doses do seu sêmen convencional – atualmente avaliadas em R$ 3.000 cada uma – para produzir sêmen sexado. Apesar do elevado custo, acredita-se que o investimento seja justificado pela expectativa de obtenção de mais embriões por dose de sêmen sexado, o que pode representar significativa melhora na rentabilidade e na eficiência do processo de seleção genética.
A voz do Sr. Evandro ecoa com a mesma força com que toma suas decisões. Tanta personalidade se traduz em pura determinação, empreendedorismo e compromisso com o setor. Só nos resta agradecer!
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