ESG: sustentabilidade na pecuária leiteira
O conceito ESG, que engloba a “Governança Ambiental, Social e Corporativa”, revela a tendência de avaliação das operações, incluindo as fazendas leiteiras, com base nos princípios de sustentabilidade.
A crescente preocupação com as mudanças climáticas e suas consequências, incluindo a ocorrência cada vez mais frequente de eventos climáticos extremos, tem impulsionado a discussão em torno do termo ESG (Environmental, Social and Governance), levando-nos a refletir sobre nossas atitudes e ações no dia a dia, tanto pessoal quanto profissionalmente. A pecuária leiteira, como uma das atividades mais importantes do agronegócio, desempenha papel fundamental ao fornecer aos consumidores alimento completo e essencial. Além disso, devido à sua ampla distribuição territorial, a pecuária leiteira não pode e nem deve se abster de contribuir para a solução desse problema global.
O que é ESG?
O termo ESG tem se difundido amplamente nos últimos tempos em todos os setores produtivos, incluindo a pecuária leiteira. Em português, ESG
significa
Ambiental, Social e Governança e refere-se ao conjunto de práticas
e políticas utilizadas para avaliar questões ambientais, sociais e
de governança dentro das empresas, promovendo operações mais
sustentáveis e responsáveis. A adoção dessas práticas tem se tornado cada vez mais relevante, permitindo às empresas abordar de forma transparente os seus clientes e consumidores, além de reduzir riscos e impactos negativos, contribuir para o desenvolvimento sustentável da sociedade, fortalecer sua reputação e atrair investidores.
Para cada uma das três letras da sigla ESG, existem diferentes práticas adotadas e difundidas:
• Ambiental: Práticas relacionadas ao meio ambiente e a sustentabilidade que permitem o aumento da eficiência energética, melhoria na gestão de resíduos, conservação dos recursos naturais e mitigação das emissões de carbono. Esse último fator está diretamente relacionado aos problemas climáticos, e a pecuária leiteira desempenha papel relevante na redução das emissões de carbono, dado seu potencial de contribuição.
• Social: Refere-se aos aspectos sociais e ao relacionamento das empresas com as pessoas ao seu redor, incluindo colaboradores e comunidades envolvidas direta ou indiretamente em suas atividades. No contexto da pecuária leiteira, também se considera o bem-estar animal como parte das práticas sociais.
• Governança: Diz respeito às práticas de gestão técnica e gerencial, ética empresarial, transparência e estrutura corporativa. Isso envolve a gestão de riscos, composição de conselhos de administração, proteção aos acionistas e prestação de contas aos investidores.
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Devido à ampla extensão territorial que ocupa, ao emprego de milhares de pessoas e à oferta de alimentos para todos os lares, a pecuária de leite desempenha papel fundamental na mitigação das emissões de carbono no Brasil, dada a sua contribuição significativa para as emissões totais de gases de efeito estufa (GEE), como dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). A pegada de carbono da pecuária de leite, ou seja, a quantidade de GEE emitida, é relevante e ocorre em todas as etapas do ciclo de produção do leite. Sendo assim, é possível adotar práticas sustentáveis em todos os setores da produção, desde a criação das bezerras até a comercialização do produto final, incluindo a produção de alimentos para o rebanho.
DEVIDO À AMPLA EXTENSÃO TERRITORIAL QUE OCUPA, AO EMPREGO DE MILHARES DE PESSOAS E À OFERTA DE ALIMENTOS PARA TODOS OS LARES, A PECUÁRIA DE LEITE DESEMPENHA PAPEL FUNDAMENTAL NA MITIGAÇÃO DAS EMISSÕES DE CARBONO NO BRASIL
ESG
na pecuária leiteira
A adoção de práticas do ESG na produção de leite contribui para a redução da pegada de carbono, melhoria na gestão de resíduos, proteção da biodiversidade, bem-estar animal, cumprimento das regulamentações ambientais e trabalhistas, além de tornar todo o negócio mais sustentável, tanto do ponto de vista ambiental como financeiro.
Em relação à sustentabilidade ambiental, podem ser adotadas práticas como:
• Gestão eficiente dos recursos hídricos;
• Utilização de fontes de energia renovável;
• Manejo adequado dos resíduos, incluindo o tratamento de dejetos, compostagem e distribuição desses resíduos nas áreas de produção de alimentos;
• Conservação dos recursos naturais, como a proteção de Áreas de Preservação Permanente (APPs), e adoção de práticas de conservação do solo baseadas na agricultura regenerativa. No âmbito social, as ações abrangem tanto o bem-estar animal quanto a responsabilidade social com as pessoas envolvidas na atividade:
• Manejo responsável dos animais, utilizando técnicas que não causem sofrimento;
• Fornecimento de condições adequadas de vida aos animais;
• Cuidados com a saúde, nutrição e prevenção de doenças;
• Relações justas com os colaboradores, pautadas pelos direitos trabalhistas, remuneração adequada, segurança no trabalho e oportunidades de desenvolvimento;
• Engajamento com as comunidades locais.
No aspecto da governança, podem ser adotadas práticas como:
• Monitoramento e avaliação de resultados;
• Gestão eficiente, incluindo a governança corporativa em conformidade com regulamentos e leis;
• Transparência e prestação de contas, frente a acionistas, consumidores e comunidades;
• Adoção de medidas de prevenção de corrupção e práticas ilegais.
A
adoção dessas práticas, especialmente quando consideramos as
questões ambientais e sociais, contribui para a redução da pegada
de carbono na produção leiteira, que está diretamente ligada à produção de alimentos para o rebanho, à digestão dos animais e ao manejo de dejetos.
Por que adotar práticas de ESG?
Durante a produção de alimentos para o rebanho, tais como pastagens, silagem e ração, diversos processos emitem dióxido de carbono, além do óxido nitroso proveniente dos fertilizantes sintéticos utilizados nas lavouras. Além disso, durante a digestão dos ruminantes ocorre a fermentação entérica, processo que resulta na emissão de metano para a atmosfera como subproduto. O manejo dos dejetos é importante em vários aspectos, seja pela emissão de óxido nitroso durante a sua decomposição, ou seja pelo seu uso como fertilizante orgânico nas lavouras, o que, a longo prazo, reduzirá a necessidade de fertilizantes sintéticos importados.
Portanto, a adoção de práticas voltadas para a melhoria da eficiência alimentar, por meio de dietas balanceadas, provenientes da produção de alimentos volumosos em quantidade e qualidade superiores e baseadas em técnicas de agricultura regenerativa, gera benefícios na redução da pegada de carbono. Isso ocorrerá porque teremos animais mais produtivos e custos de produção otimizados.
Independentemente da ação adotada, o foco nunca deve se desviar da questão da gestão da atividade, pois o produtor de leite também deve manter a sustentabilidade econômica da atividade. E a boa notícia é que essas práticas têm trazido bons retornos financeiros ao produtor.
Os dejetos produzidos pelos bovinos contêm nutrientes valiosos, que quando adequadamente tratados, podem ser aproveitados como fertilizantes em lavouras e pastagens
Resultados alcançados
Informações de projetos gerenciados pela Labor Rural, responsáveis por monitorar mais de 500 propriedades leiteiras, revelam que propriedades que emitem menos carbono obtêm maior lucratividade. A emissão de carbono na atividade leiteira é medida pela quantidade de dióxido de carbono equivalente emitido por litro de leite produzido, corrigido para gordura e proteína (Kg de CO2eq/Kg FPCM).
Ao estratificar as fazendas com base no indicador de emissões totais (Kg de CO2eq/Kg FPCM), o estrato das fazendas com menor emissão (25% da amostra) apresenta rentabilidade média, medida pela “taxa de remuneração do capital com terra (%)”, de 19% ao ano, superior ao resultado do grupo das fazendas com maior emissão (25% da amostra), que registra uma rentabilidade média de 8,1% ao ano. Outro indicador importante na análise é a produtividade da terra, expressa pela “produção/área destinada à atividade (litros/hectare/ano)”. As fazendas com menor emissão produzem 14.861 litros/hectare/ano, o que representa um aumento de 98% em comparação com as fazendas com maior emissão, que produzem 7.506 litros/ hectare/ano.
Surpreendentemente,
as fazendas com menor emissão também apresentam custo de produção
de 1,88 (expresso pelo “custo operacional total do leite em R$/
litro”), menor do que o custo de 1,99 das fazendas com maior emissão (Tabela 1). No caso da estratificação das fazendas com base na rentabilidade média, medida pela “taxa de remuneração do capital com terra (%)”, o grupo das fazendas mais rentáveis (25% da amostra) apresenta emissão total média de 1,54 Kg de CO2eq/Kg FPCM, enquanto o estrato das fazendas menos rentáveis (25% da amostra) possui emissão total média de 1,80 Kg de CO2eq/Kg FPCM.
A ADOÇÃO DE PRÁTICAS VOLTADAS PARA A MELHORIA DA EFICIÊNCIA ALIMENTAR, POR MEIO DE DIETAS BALANCEADAS, PROVENIENTES DA PRODUÇÃO DE ALIMENTOS VOLUMOSOS EM QUANTIDADE E QUALIDADE SUPERIORES E BASEADAS EM TÉCNICAS DE AGRICULTURA REGENERATIVA, GERA BENEFÍCIOS NA REDUÇÃO DA PEGADA DE CARBONO
Benefícios do ESG
É fato que a adoção de práticas ESG na pecuária leiteira não apenas traz benefícios ambientais, como a redução das emissões de carbono para a atmosfera, mas também melhora a reputação das fazendas. Isso abre a possibilidade de melhorar os preços dos produtos e reduzir os custos de produção. Do ponto de vista das empresas que processam o leite, a adoção dessas práticas pode agregar valor às marcas, resultando em oportunidades de diferenciação e acesso a mercados que valorizam produtos mais sustentáveis.
JOÃO PAULO MORAIS - Head de projetos ESG da Labor Rural
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