Este site utiliza cookies

Salvamos dados da sua visita para melhorar nossos serviços e personalizar sua experiência. Ao continuar, você concorda com nossa Política de Privacidade, incluindo a política de cookie.

Novo RLI
x
ExitBanner
Nutrição

Fontes alternativas de energia e proteína para bovinos leiteiros

Fontes alternativas de energia e proteína para bovinos leiteiros

Flávio Augusto Portela Santos - Professor do Departamento de Zootecnia da USP/ESALQ

Junio Cesar Martinez - Doutor em Ciência Animal e Pastagens pelo Departamento de Zootecnia da USP/ESALQ

 

Dando continuidade ao assunto iniciado na e-dição passada, nesse número, apresentaremos mais três sub-produtos que podem ser utilizados como fontes alternativas de energia ou proteína para bovinos leiteiros, visando à redução nos custos da dieta. Vale salientar novamente que a avaliação de custo x benefício, bem como a análise da composição bromatológica das fontes a serem utilizadas, é fundamental para garantir a lucratividade e assegurar a saúde dos animais.

 

Casca de Soja

casca de soja 5.JPG (66 KB)

Características do produto

 

A produção nacional de soja vem crescendo de forma expressiva nos últimos anos. As expectativas são que o país se torne, em breve, o maior produtor mundial de soja.

Do processamento da soja, para extração do óleo, geram-se dois subprodutos de grande importância na alimentação de bovinos: o farelo de soja e a casca de soja. A casca passa por um processo de tostagem, para inativar a enzima uréase, e posterior moagem, para aumentar a densidade do material. Cada tonelada de soja moída para a extração do óleo gera, em média, 183 kg de óleo, 733 kg de farelo (48%) e 50 kg de casca (5%).

No Brasil, produz-se, principalmente, o farelo de soja 46, e não o 48%. Isso resulta em maior adição de casca ao farelo e menor disponibilidade de casca no mercado. Mesmo assim, a estimativa atual é que a disponibilidade de casca no mercado gire em torno de 1,6 milhões de toneladas, o que coloca esse subproduto como uma importante opção aos produtores de leite.

A casca de soja é composta, principalmente, de fibra, que tem pouco valor na alimentação humana e no uso industrial. No entanto, suas caracte-rísticas físico-químicas, a facilidade de aquisição em algumas regiões e seu preço compe-titivo fazem da casca de soja um alimento interessante para o gado leiteiro. Além do que, pode contribuir para um ambiente ruminal mais favorável para a digestão de fibra e menor risco de acidose. Alternativamente, a casca de soja pode ser usada como uma fonte de fibra, em substituição parcial ao volumoso.

Em parte, o valor nutricional da casca de soja para ruminantes é determinado pela natureza química da casca. Como para muitos outros subprodutos, a composição química da casca de soja varia muito entre as indústrias processadoras.

A fração fibrosa da casca de soja, que contém relativamente grande quantidade de celulose (aproximadamente 43% da MS) e hemicelulose (aproximadamente 18% da MS), é muito pouco lignificada (1,4 a 4,3%). O teor de amido tem variado de 0 a 9,4%, com valores médios de 3,6%, e os teores médios de pectina têm se situado em torno de 12,8% da MS. Outras características podem ser observadas na Tabela 1.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.25.41.png (157 KB)

O valor nutricional da casca de soja é afetado pela taxa com que é digerida no rúmen e pela taxa com que ela passa do rúmen para os outros compartimentos do trato gastrintestinal. Dados de experimentos in situ e in vitro mostram que os microrganismos ruminais são capazes de fermentar extensivamente a casca de soja. Em sete de cinco estudos, a fração fibra em detergente neutro (FDN) da casca de soja foi fermentada com uma taxa média de 5,6%/h, e, em quatro estudos, o desaparecimento de FDN foi em torno de 90%, após 96 horas de incubação.

 

Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com casca de soja

 

Avaliando-se o desempenho de vacas leiteiras e a substituição do milho pela casca de soja, em 13 de 15 estudos, não houve diferença no consumo de animais alimentados com dietas controle, comparados àqueles que receberam casca de soja. A correlação entre produção de leite e a porcentagem de casca de soja na dieta, em 10 estudos, foi baixa e não significativa. O teor de gordura do leite não se correlacionou com a concentração de casca de soja na dieta, ou com o teor de FDN proveniente da casca de soja, em 10 dos estudos revisados.

A substituição de grão de cereais por casca de soja diminuiu o teor de proteína do leite. Essa resposta pode parcialmente ser explicada pelo baixo teor de carboidratos não estruturais em dietas que contém altos níveis de casca de soja, podendo limitar a síntese de proteína microbiana no rúmen.

Embora a substituição parcial ou total do milho moído fino por casca de soja possa não afetar o consumo e a produção de leite, estudos têm demonstrado que a eficiência alimentar (LCG 3,5%/CMS) foi maior nas dietas contendo casca de soja, conforme apresentado na Tabela 2. Esses dados mostram a possibilidade de redução nos custos de alimentação de vacas de bom potencial de produção, com a substituição parcial ou total do milho por casca de soja, em dietas contendo silagem de milho como volumoso e polpa cítrica como concentrado energético.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.25.47.png (200 KB)

A casca de soja, quando incluída em dietas contendo silagem de milho como volumoso, em substituição à polpa cítrica peletizada, apresentou valor nutricional similar ao da polpa cítrica, conforme pode ser observado na Tabela 3.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.25.54.png (197 KB)

Farelo de Glúten de Milho-21 (Refinasil ou Promill)

refinazil 1.JPG (70 KB)

Características do produto

 

O FGM-21 é um subproduto da indústria, à base de milho, basicamente, amido e adoçantes, conhecido pelos nomes comerciais de Refinazil® ou Promill®. É obtido pela separação e secagem das fibras dos grãos de milho durante o processo de moagem úmida do cereal. Tecnicamente, é o que sobra do grão de milho, após a extração da maior parte do amido, glúten e germe, pelos processos de moagem e separação, empregados na produção de amido e xarope de milho, sendo 2/3 de conteúdo fibroso e 1/3 de licor concentrado de maceração. O rendimento na produção de FGM-21 é estimado em 11% do material original que chega na indústria.

Nos EUA e Europa, o FGM-21 é comercializado na forma úmida, apresentando cerca de 42% de matéria seca (MS), ou na forma seca, com 90-92% de MS. O FGM-21 úmido tem sua utilização restrita às proximidades das fontes produtoras, devido ao custo do frete. No Brasil, comercializa-se, principalmente, o FGM-21 na forma seca, entretanto, esse subproduto passou a ser co-mercializado também na forma úmida, no país, recentemente. A produção anual de FGM-21 gira em torno de 230 mil toneladas.

A Tabela 4 apresenta uma comparação entre as composições nutricionais do milho com o FGM-21, úmido e seco. A composição final do subproduto pode variar em função das condições de cada indústria, de forma que sempre se recomenda a análise dos teores nutricionais do FGM-21 antes de sua utilização.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.25.59.png (190 KB)

O FGM-21 pode ser utilizado tanto como fonte de energia, como de proteína. Normalmente, quando incluído na dieta de vacas leiteiras, o FGM-21 substitui parte do cereal, na maior parte dos casos, o milho, e também permite reduzir a dose de suplementos protéicos, como farelo de soja, farelo de algodão e uréia. A proteína do FGM-21 é bastante degradável no rúmen. A fração de proteína não degradável no rúmen é pequena e deficiente em lisina.

Em função de suas características – pobre em gordura e amido e bastante rico em fibra altamente digestível –, o FGM-21 constitui-se em uma ótima alternativa para inclusão em dietas baseadas em grãos e silagem de milho. Por apresentar concen-trações mais elevadas de FDA e FDN do que os grãos de cereais, a utilização do FGM-21 pode levantar questões sobre a concen-tração energética e limitações ao consumo das dietas. Contudo, os teores reduzidos de amido e e-levados de fibra digestível podem ajudar a manter o pH ruminal em patamares mais desejáveis, otimizando a digestão da fibra, o que pode compensar possíveis diferenças na digestibilidade total das dietas.

 

Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com Refinasil

 

Cinco estudos foram encontrados em que o FGM-21 (úmido ou seco) substituiu apenas o concentrado, sendo incluído nas do-ses entre 10 a 40% da MS das dietas. O consumo não foi afetado pelo FGM-21 em três estudos, foi aumentado em um e reduzido em um. A produção de leite corrigido para gordura não foi alterada em dois dos estudos, aumentou em dois e diminuiu em um deles.  No estudo em que houve efeito negativo na produção de leite, este ocorreu apenas na comparação na qual o FGM-21 foi incluído em dose alta na dieta (40% da MS). Nesse caso, também houve redução no CMS.

Por outro lado, foram encontrados 6 estudos em que o FGM-21 substituiu parte do volumoso e parte do concentrado, sem efeito no consumo e na produção de leite corrigido para gordura em 5 dos estudos. Em apenas um estudo, houve aumento no consumo e produção de leite corrigido para gordura.

Estudos conduzidos recentemente no Departamento de Zootecnia da ESALQ, com vacas alimentadas com silagem de milho (Tabela 5), ou mantidas em pas-tagens de capim elefante, manejadas intensivamente (Tabela 6), resultaram em dados concordantes com os acima citados.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.26.06.png (137 KB)

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.26.09.png (163 KB)

Nota-se que o consumo, a produção de leite e de leite corrigido para gordura não foram alterados pelos tratamentos. A substituição do milho por FGM-21 resultou em aumento linear no teor de gordura e redução no teor de proteína do leite. O aumento no teor de gordura do leite pode ser explicado por um efeito conjunto de redução no teor de amido e aumento no teor de fibra da dieta. Da mesma maneira, a redução no teor de amido da dieta pode explicar em parte a redução no teor de proteína do leite. Pela Tabela 5, podemos concluir que vacas leiteiras, com produção ao redor de 25 kg de leite/d, quando alimentadas com silagem de milho, podem receber concentrado contendo polpa cítrica e FGM-21 em partes iguais e sem milho, sem que haja queda no consumo e produção de leite. Essa prática permite reduzir os custos de alimentação das vacas, especialmente durante a entresafra do milho, quando o custo do grão é elevado e dos subprodutos é baixo.

Pode-se concluir, então, que o FGM-21, tanto na forma úmida, como seca, quando utilizado em substituição parcial ao concentrado ou ao concentrado e volumoso, não tem grande efeito no desempenho de vacas leiteiras e pode se constituir em uma alternativa de custo vantajoso em relação à mistura milho mais farelo de soja.

 

Farelo de Trigo

trigo 8.JPG (91 KB)

Características do produto

 

Da produção da farinha de trigo para consumo humano resultam vários subprodutos, dentre eles o farelo, o gérmen e frações de aleurona do grão. Todos esses subprodutos são adequados para a alimentação animal, porém apenas o farelo de trigo tem importância comercial no Brasil. De cada tonelada de trigo processado, 70 a 75% são convertidos em farinha, e o restante, 25 a 30%, é transformado em subproduto, com uso potencial na alimentação animal.

Como o objetivo do processamento industrial é obter a farinha – esta  basicamente constituída por amido –, o farelo de trigo concentra quase a totalidade dos minerais e vitaminas dos grãos, com teores relativamente constantes.

A Tabela 7 apresenta a composição bromatológica do farelo de trigo. Sua proteína apresenta alta degradabilidade, e o alimento, como um todo, apresenta alta degradabilidade inicial, quando comparado com outros subprodutos. Sua fibra apresenta efetividade mediana, quando comparada com as forragens, porém mais alta que a maioria das fibras dos alimentos concentrados.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.26.17.png (171 KB)

 

Desempenho de vacas leiteiras alimentadas com farelo de trigo

A literatura é carente em dados de comparação do farelo de trigo com outras fontes energéticas, especialmente o milho.

Apesar de ser grandemente usado na alimentação de gado de corte, a quantidade de farelo de trigo que pode ser usada nas rações de vacas leiteiras ainda não está totalmente definida. Freqüentemente, a quantidade usada é limitada a ¼ do concentrado, por questões ligadas à palatabilidade e ao desempenho animal. Com relação à palatabilidade, a peletização ameniza esse problema em misturas com altas quantidades de farelo de trigo.

Por causa da alta digestibilidade, o farelo de trigo tem sido usado, principalmente, para substituir grãos de cereais. É comumente utilizado como fonte de energia e proteína em concentrados comerciais para vacas em lactação. A energia contida no farelo de trigo é similar à contida nos grãos, entretanto, a energia está na forma de fibra digestível, e não na forma de amido. A proteína bruta do farelo de trigo é extensivamente degradada rúmen e promove poucos aminoácidos para o abomaso em relação a outras fontes de subprodutos de alta energia. Entretanto, a aparente baixa energia contida no farelo de trigo, comparado com o milho, era contrabalançada pela variação benéfica na ingestão de forragem e/ou digestibilidade.

O consumo de vacas alimentadas com farelo de trigo, em substituição ao milho, em até 60%, tende a ser igual ao observado nas dietas controle, formuladas com base em farelo de soja, milho moído e silagem de milho. Por outro lado, em relação ao refinasil e à casca de soja, o consumo tendeu a ser diferente. Entretanto, quando o farelo de trigo substituiu substancialmente a forragem (15%), houve aumento no consumo.

Captura de tela 2016-10-07 a?s 11.26.22.png (147 KB)

Vacas que recebem dieta com farelo de trigo podem apresentar maior concentração ruminal de amônia do que aquelas alimentadas com dieta alta em forragem. A concentração foi sempre acima de 11 mg/dL, sendo adequado para síntese de proteína microbiana e digestão do alimento. Também, a digestibilidade do nitrogênio aumentou de 55 para 61,9%, quando o farelo de trigo esteve presente na dieta.

Em substituição ao milho, a produção de leite se manteve inalterada com a utilização de farelo de trigo, em até 45% do concentrado. Quando a inclusão foi entre 45 e 60%, a produção de leite reduziu. Em combinação com refinasil e casca de soja, com dois níveis de farelo de trigo na dieta, a produção de leite foi mantida, embora o teor de gordura houvesse diminuído.

O teor e a produção de gordura do leite aumentaram linearmente, à medida que se aumentou a proporção dos subprodutos farelo de trigo, grãos destilados e caroço de algodão, associados a diferentes níveis de milho de alta umidade. Entretanto, a maior percentagem de gordura do leite foi observada quando se forneceu dieta sem subprodutos e com baixo teor de milho de alta umidade. Por outro lado, outros estudos não observaram efeito sobre a produção e composição do leite, em dieta contendo 22,38% de farelo de trigo, com igual quantidade de casca de soja, farelo de glúten de milho ou 34,5% de milho moído. Alguns estudos demonstraram tendência para maior teor de gordura para vacas consumindo casca de soja, em relação ao farelo de trigo. A lactose e os sólidos totais desengordurados tendem a ser maiores para a dieta com farelo de trigo.

Em estudo recentemente conduzido na ESALQ, observou-se que a substituição dos grãos de milho pelo farelo de trigo, em dietas de vacas leiteiras em confinamento, produzindo em torno de 30 kg/leite/dia, com o nível mais alto de inclusão, foi desvantajosa. No entanto, no nível intermediário de substituição, observou-se aumento na produção de leite, sem alteração nos parâmetros de composição do leite. Nesse caso, quando o custo de aquisição do subproduto for competitivo em relação ao milho, sua utilização pode ser uma alternativa interessante em sistemas de produção de leite.

Quando a palatabilidade não é problema, o farelo de trigo pode ser incorporado facilmente nas dietas de ruminantes, desde que seja viável economicamente. Porém, quando utilizado em grandes quantidades na dieta, o desempenho dos animais diminui. Portanto, as vacas alimentadas com dietas contendo grandes quantidades de farelo de trigo poderão ser beneficiadas de adicional proteína não degradável no rúmen, especialmente durante o início da lactação. De maneira geral, o farelo de trigo pode constituir até 45% do concentrado, ou 25% da dieta, sem afetar a produção e a composição do leite. •

Compartilhar:


Comentários

Enviar comentário


Artigos Relacionados