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Sanidade

O PERIGO TEM NOME

A absorção do dietilenoglicol é altamente perigosa e pode resultar em óbito dos animais em curto período de tempo

O PERIGO TEM NOME

O dietilenoglicol é uma substância líquida incolor, que apresenta cheiro suave e sabor adocicado. Em países com invernos rigorosos, é utilizado como anticongelante para carros, além de servir como solvente em alguns processos industriais. Em Minas Gerais, recentemente foi descrito um surto de casos de intoxicação em humanos, por meio da ingestão de bebidas alcoólicas contaminadas com esta substância. Na época, com a repercussão, o dietilenoglicol parou de ser utilizado como solvente nas indústrias e começou a ser vendido ilegalmente como substituto de propilenoglicol e glicerina. A ingestão de dietilenoglicol é altamente tóxica e pode levar à morte dentro de poucas horas. A ocorrência dos sinais clínicos e a gravidade da intoxicação variam de acordo, principalmente, com a dose ingerida.

Como o dietilenoglicol intoxica bovinos? 

Atualmente, na criação de bovinos, a fluidoterapia oral tem sido prática amplamente utilizada para combater a desidratação causada por diversas doenças e circunstâncias. O drench, como é conhecido nas fazendas, é composto por água, sais minerais e um precursor da glicose chamado propilenoglicol.
O propilenoglicol é utilizado em grandes doses como fonte de energia para um único animal. Por exemplo, um animal de aproximadamente 450 Kg pode ingerir cerca de 20 litros de drench contendo cerca de 300 mL de propilenoglicol misturado na fluidoterapia oral. No entanto, caso o produtor ou funcionário compre acidentalmente dietilenoglicol em vez de propilenoglicol, a intoxicação pode ocorrer em poucas horas após a ingestão, levando à morte do animal. 
A principal diferença entre essas duas substâncias está no nível de toxicidade. Enquanto o propilenoglicol é considerado um componente não tóxico, o dietilenoglicol é um subproduto altamente tóxico. Devido à crescente demanda do propilenoglicol como componente do soro oral para ruminantes, bem como seu uso na indústria farmacêutica e de perfumaria humana, seu valor de mercado tem apresentado aumentos consideráveis.

 A INGESTÃO DE DIETILENOGLICOL É ALTAMENTE TÓXICA E PODE LEVAR À MORTE DENTRO DE POUCAS HORAS 

A falta de disponibilidade no mercado e o alto valor associado a essa substância propiciaram a substituição indevida por líquidos contaminados com dietilenoglicol. 

Para diferenciar essas duas substâncias de forma assertiva, é necessário realizar análises laboratoriais, já que apenas indicativos como o cheiro não são sufi cientes. É importante ressaltar que a ingestão de ambas as substâncias pode ser extremamente prejudicial para a saúde de animais e seres humanos e, portanto, não deve ser ingerida para verificação do sabor adocicado.

Quais são os sinais clínicos? 

Após a ingestão, o dietilenoglicol é rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal e direcionado ao fígado para metabolização. Posteriormente, é transformado em dois principais componentes: o ácido 2-hidroxietoxiacético (de baixa toxicidade) e o ácido diglicólico (de alta toxicidade).  

O ácido diglicólico induz a necrose, ou seja, a morte das células tubulares proximais renais, promovendo quadro de insuficiência renal aguda - um sintoma clássico dessa intoxicação.
Os sinais clínicos ocorrem em três fases principais, que são didaticamente divididas, mas podem ocorrer simultaneamente. Como mencionado anteriormente, a gravidade do quadro e a apresentação clínica são determinadas, principalmente, pela dose ingerida.

1ª fase: A sintomatologia tem início cerca de 30 minutos após a ingestão da substância. Nessa etapa, o animal pode apresentar alterações neurológicas, como mudanças na posição e orientação do corpo, reflexos nervosos superficiais e profundos reduzidos, depressão e alterações gastrointestinais, como regurgitação do conteúdo ruminal. Esse primeiro momento pode durar até 12 horas após a ingestão do dietilenoglicol. 

2ª fase: Após 12 a 24 horas da ingestão, ocorrem manifestações cardiopulmonares, como edema pulmonar, taquicardia, taquipneia e insuficiência cardíaca. 

3ª fase: Essa fase é considerada letal, pois não há reversão da sintomatologia clínica. Consiste na insuficiência renal aguda provocada pela necrose das células tubulares proximais, essenciais para o funcionamento renal. 

Como diagnosticar? 

O diagnóstico é feito com base no histórico clínico, apresentação dos sinais clínicos, necropsia dos animais que vieram a óbito, exames laboratoriais e análise do componente suspeito. Durante a necropsia, logo na abertura da cavidade abdominal, é possível visualizar o intenso edema ao redor dos rins e, no caso das fêmeas, do útero (Figura 1).

 Figura 1. Edema ao redor do útero

 Outro achado importante é a presença de petéquias, que são pequenas manchas avermelhadas em diferentes partes da cavidade interna do animal (Figuras 2 e 3). Essa alteração ocorre pelo extravasamento de sangue dos vasos sanguíneos. Além disso, é possível encontrar vasos sanguíneos mais dilatados (Figura 4) e mucosas mais coradas, em virtude do aumento da vascularização, causada, possivelmente, pela inflamação sistêmica desses animais (Figura 5).
Ao avaliar os órgãos do trato gastrointestinal, mais especificamente o abomaso, responsável pela digestão química do alimento, podem ser encontradas úlceras em sua mucosa. Essas úlceras podem estar em estágio inicial ou já avançado, quando começam a se tornar hemorrágicas, liberando sangue para dentro do órgão. Na fase mais grave, o conteúdo do abomaso apresenta coloração vermelho-escura (Figuras 6 e 7).

 

  

  Ao examinar o coração, é possível identificar uma hipertrofia concêntrica (Figura 8), que se caracteriza pelo aumento da musculatura das paredes do órgão (Figura 9). 

Após a realização da necropsia e análise completa de todos os órgãos que apresentarem alterações, é necessário coletá-los em fragmentos pequenos e conservá-los em formol a 10%. Esses fragmentos devem ser enviados para a histopatologia, onde cada orgão será submetido à análise microscópica.
Além disso, é fundamental realizar exames laboratoriais, principalmente o exame de bioquímica, que avalia o grau de insuficiência renal por meio da aferição das concentrações de ureia e creatinina no sangue, metabólitos eliminados pelos rins. Quanto maiores os valores dessas substâncias no sangue, maior o grau de insuficiência renal apresentada pelo animal e mais grave é considerado o quadro.
O funcionamento do fígado também deve ser avaliado por meio da bioquímica sérica, em que as enzimas aspartato aminotransferase (TGO) e gama glutamiltransferase (GGT) em valores aumentados podem indicar lesão hepática. Apesar desses achados, para se chegar a confirmação diagnóstica, é necessária a avaliação laboratorial do líquido suspeito.

Existe tratamento? 

Considerando os sinais clínicos apresentados pelos animais intoxicados, o tratamento consiste em fornecer suporte ao animal para reverter o quadro. Nesse processo, a fluidoterapia venosa com reposição de eletrólitos e energia é crucial para o controle da acidose metabólica e para a tentativa de redução da extensão da lesão renal. O uso de medicações anti-infl amatórias e antibióticas pode ser necessário, dependendo da avaliação do médico veterinário.
Devido à rápida evolução dos sintomas, desde o momento em que o animal ingere a substância até o estágio três da doença, o tratamento é quase sempre sem sucesso. A difi culdade em reverter os sinais clínicos a campo, apesar do suporte de medicamentos, torna o tratamento ainda mais difícil.

 DEVIDO À RÁPIDA EVOLUÇÃO DOS SINTOMAS, DESDE O MOMENTO EM QUE O ANIMAL INGERE A SUBSTÂNCIA ATÉ O ESTÁGIO TRÊS DA DOENÇA, O TRATAMENTO É QUASE SEMPRE SEM SUCESSO

Recomendações 

O propilenoglicol é uma fonte de energia extremamente importante para vacas recém-paridas e bovinos doentes. É fundamental prestar atenção à empresa fornecedora do produto, desconfi ar de preços muito baixos e ler atentamente os componentes do produto. Ademais, é imprescindível verificar no rótulo do produto comprado se existe alguma recomendação contrária à administração do propilenoglicol aos animais.


 


MARIA VITÓRIA GERMANO JOAQUIM - Mestranda em Ciência Animal pela EV-UFMG
GABRIELA ANTEVELI - Mestranda em Ciência Animal pela EV-UFMG
RODRIGO MELO MENESES - Professor de Clínica de Ruminantes da EV-UFMG


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