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Potencial de produção de leite em áreas irrigadas no semiarido cearense

Potencial de produção de leite em áreas irrigadas no semiarido cearense

Texto: Rodrigo Gregório da Silva, Marcos Neves Lopes, Luiz Barreto de Moraes Neto, Cleber Medeiros Barreto

O estado do Ceará, devido a aspectos climáticos, de localização, de infra-estrutura de transporte e hídrica, associados à disponibilidade de solos adequados a esses modelos, apresenta condição que tem possibilitado a introdução de sistemas de produção animal, em bases intensivas, sob modelos que utilizam a irrigação. O conhecimento científico, fundamentando o desenvolvimento tecnológico e as ações de Estado, tem dado oportunidade de criar uma estrutura que tem mudado a realidade dos sistemas de produção. Partindo-se de modelos extremamente dependente das condições naturais para modelos com maiores índices de produtividade e com menor oscilação da produção ao longo do tempo.

A produção de leite tem sido objeto de discussões freqüentes, sobretudo no que tange ao seu potencial de geração de postos de ocupação e renda, assim como nos seus aspectos técnicos. Nesse sentido, não é difícil observar extensos debates quanto ao tipo ideal de capim, de animal ou de sistema de produção.

Não sendo objetivo desse texto discutir os pontos mencionados anteriormente, falar-se-á sobre uma modalidade de sistema de produção de leite a pasto, levando-se em consideração algumas variantes desse, no ambiente semiárido, utilizando-se a prática da irrigação. Ou seja, sistemas de produção de leite em pastagens irrigadas e adubadas, com animais podendo receber suplementação, visando à maximização dos resultados econômicos, por unidade de área, nas condições de semiárido brasileiro.

Nesse sentido, o estado do Ceará, devido a aspectos climáticos (baixa variação da temperatura e insolação ao longo do ano), de localização (próximo a mercados como Norte Americano, Africano e Europeu), de infra-estrutura de transporte (estradas, aeroporto e porto) e hídrica (reservatórios de grande porte), associados à disponibilidade de solos adequados a esses modelos, apresenta condição que tem possibilitado a introdução de sistemas de produção animal, em bases intensivas, sob modelos que utilizam a irrigação (Tabela 1).

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Mas, essas vantagens comparativas, ainda não constituem vantagens competitivas, resultando em condições muitas vezes desfavoráveis no que se refere à questão econômica (exportação de divisas), menor disponibilidade de empregos (exportação de empregos) e risco quanto à segurança alimentar (produção menor que o consumo). Exemplificando, tem-se o balanço comercial de leite e derivados do estado do Ceará que, no ano de 2010, apresentou saldo negativo de US$ 1.298.551,00.

Os sistemas de produção agropecuários desenvolvidos nessa região têm apresentado elevada variação nos seus desempenhos produtivos e econômicos, fortemente relacionada com a variação da precipitação pluviométrica entre regiões (Figura 2)  e ao longo do tempo. A título de exemplo, para a região central do estado (Município de Quixadá), observa-se anos com precipitação de 217,0 mm e outros com 1.616,5 (Figura 1).

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Essa característica não é exclusiva dessa região, mas, tem sido realizado o ajuste da estrutura produtiva no sentido de sua regularização, passando pela regularização da oferta de água, frente à grande oscilação característica desta região (Figura 1). Isso tem sido possível pela implementação dos barramentos dos cursos naturais da região, por meio de ações governamentais, no sentido da construção dessas barragens, possibilitando o desenvolvimento de sistemas de produção vegetal e animal baseados na irrigação.

O estado do Ceará utilizou em 2007, para a produção agropecuária irrigada, seja em áreas Públicas Federais e Estaduais ou Privadas, o equivalente a 74.759 ha. Já a área utilizada para a produção de pastagem irrigada oscilou entre 770 ha, segundo a Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Ceará, a 881 ha, segundo o DNOCS, com valor ficando entre 1,0 e 1,2% do total. Ainda segundo levantamentos oficiais, há no Estado, somente nos perímetros irrigados (Figura 2), o equivalente a 40.481 ha passíveis de irrigação, estando plantada (ano agrícola de 2007) área equivalente a 20.229,7 ha, o que representa aproximadamente 50,0% da área total disponível.

Os reservatórios de água superficiais, que viabilizam grande parte da irrigação no Estado, apresentam capacidade de acúmulo de 17,8 bilhões de m³, com 14,4 bilhões de m³ localizados na bacia do Rio Jaguaribe. Isso representa 80,0% de toda a capacidade estadual, como resultado do direcionamento natural das bacias hidrográficas estaduais, em que grande parte conflui para um único local de deságua (Foz do Rio Jaguaribe), como também, e fortemente influenciada pela primeira característica, da implementação de estruturas de acúmulo da água, que flui ao longo dessa região. Todavia, vale salientar que esse armazenamento apresenta distribuição irregular, não sendo difícil observar microrregiões com limitação hídrica, mesmo estando localizada em macrorregião com grande volume de água acumulada.

Esse volume tem capacidade de regularizar 128,72 m³.s-1, com garantia de 90% ou 22% (3,9 bilhões de m³) da capacidade máxima estocável (17,8 bilhões de m³). A demanda estadual estimada, para os setores agropecuário, industrial e consumo humano, no mesmo ano de avaliação da oferta acima descrita, foi de 1,48 bilhões de m³, o que demonstra possibilidade de crescimento na utilização desta água, sobretudo na solução da oferta de água para essas demandas. Salienta-se que, caso se deseje elevar o nível de garantia dos 90% utilizado acima, para garantias maiores, haverá diminuição da capacidade de crescimento da estrutura de produção estadual.

O conhecimento científico, fundamentando o desenvolvimento tecnológico e as ações de Estado, tem dado oportunidade de criar uma estrutura que tem mudado a realidade dos sistemas de produção (Figura 2, na primeira imagem). Partindo-se de modelos extremamente dependente das condições naturais (resultando em elevada variabilidade) para modelos com maiores índices de produtividade e com menor oscilação da produção ao longo do tempo (Figura 2, na segunda imagem).

A base desse desenvolvimento tem sido a irrigação e a fertilização, associada ao conhecimento e implementação de técnicas de manejo da irrigação, manejo da  adubação, manejo do pastejo e gestão de empresas (Figuras 3 e 4).

 
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A irrigação em áreas de pastagens, objetivando máxima produção econômica, pressupõe que outros insumos, além do suprimento adequado de água, sejam providos, com o propósito de não restringir o potencial de produção de forragem cultivada. Dentre esses insumos, destaca-se o nitrogênio, devido ao efeito positivo que exerce sobre a produção de biomassa de forragem das gramíneas tropicais. Assim, a eficiência da adubação nitrogenada (kg de biomassa de forragem produzida/kg de nitrogênio aplicado) em função da irrigação, constitui variável relevante a ser considerada nos sistemas de produção em pastagens manejadas intensivamente (Figura 5). Nesse contexto, as possibilidades de sucesso do sistema produção animal em pastagens aumentam de forma significativa quando se faz opção por forrageiras de alto potencial de produção, desde que as exigências nutricionais e de manejo das mesmas sejam atendidas adequadamente.

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O controle rigoroso na aplicação de água em pastagens irrigadas, no que tange ao momento e a quantidade correta a ser aplicada, evitando-se excessos e déficit ao longo do ciclo da forrageira, e suprindo as necessidades hídricas das plantas, são os princípios de manejo que devem ser buscados para obtenção de uma produção máxima econômica.

A importância do criterioso manejo adotado na irrigação, podendo ser realizado por meio de tensiometria é ratificado por trabalhos de pesquisa nos quais os autores avaliaram o capim-massai submetido a doses crescentes de nitrogênio em condições de casa de vegetação e acompanharam a demanda hídrica da forrageira em função da elevação no suprimento de adubação nitrogenada.

Dados de pesquisa indicam que a lâmina de água aplicada (LAM) variou de 225,19 a 445,87 mm ciclo-1 (rebrotação 1) e de 183,62 a 375,86 mm ciclo-1 (rebrotação 2) para as doses de nitrogênio de 0 a 600 mg dm-3 de solo, respectivamente. Com a dose nitrogênio de 600 mg dm-3 de solo, a LAM foi aumentada em 98,0 e 104,7%, nas rebrotações 1 e 2, respectivamente, em relação ao tratamento que não recebeu adubação nitrogenada.

Nos estudos de produção de forragem é relevante o conhecimento dos componentes da biomassa de forragem total, destacando-se na abordagem apresentada (Tabela 2) os componentes, a saber: biomassa de forragem verde (BFV, constituindo a fração verde da biomassa total pré-seca a 55 oC, até peso constante) e biomassa de lâmina foliar verde (BLV, constituindo a fração de lâmina foliar verde da biomassa total pré-seca a 55 oC, até peso constante), dada a importância dos mesmos em termos quantitativos e sobre a qualidade da forragem produzida.

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Vale destacar que a intensificação da produção das pastagens por meio da irrigação e adubação nitrogenada é favorecida em regiões com alta incidência de luminosidade e com elevadas temperaturas, como é o caso da região Nordeste, destacando-se aqui o estado do Ceará, por ser o foco do estudo apresentado. Tal afirmativa é ratificada por vários trabalhos de pesquisa realizados na Fazenda Experimental do Vale do Curu – FEVC/UFC, localizada no município de Pentecoste – CE. Nesses estudos, trabalhou-se com capim-tanzânia em condições de manejo intensivo, com uma dose de nitrogênio equivalente a 600 kg ha-1 ano-1 de nitrogênio e recebendo uma lâmina líquida diária de 7,98 mm em sistema de irrigação do tipo aspersão fixa de baixa pressão (Pressão de serviço < 2,0 kgf/cm2); e avaliando o capim-massai adubado com doses crescentes de nitrogênio e irrigado com uma lâmina líquida de 7,00 mm dia-7 em sistema de irrigação semelhante ao anteriormente mencionado, numa pastagem pertencente ao Núcleo de Ensino e Estudos em Forragicultura/UFC, em Fortaleza – CE (Tabela 2).

Com base nessas informações, foram estimados valores de produtividade das pastagens (kg de MS de BFV × ha-1 x dia-1) e seus reflexos na capacidade de suporte das mesmas. Para tanto, foi utilizada na simulação as demandas de uma vaca com 450 kg de peso vivo, em meio de lactação, produzindo 16,0 L de leite, com consumo diário estimado de 13,23 kg de MS, e recebendo suplementação de 3,7 kg de concentrado.

Observa-se que os resultados de potencial de produção verificados nas pesquisas desenvolvidas nesta região, apontam para uma evolução que pode vir a contribuir na elevação dos parâmetros técnicos e econômicos dos sistemas locais. Essa evolução pode ser exemplificada pela mudança na capacidade de suporte que, no ano de 2004, (primeiro experimento) foi de aproximadamente 9,0 UA × ha-1 atingindo o patamar de 22 UA × ha-1 (mais recente experimento) (Figura 6).

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Como exemplo, caso seja utilizada a área para manutenção somente de vacas, em lactação e secas, com 78% de vacas em lactação, há a possibilidade de manter-se (baseado no primeiro experimento), por hectare, o total de 9 vacas, sendo 7 em lactação, produzindo 112 L × ha-1 × dia-1.  Levando-se em consideração a evolução do potencial descrito anteriormente (mais recente experimento), há a possibilidade de manter-se 22 vacas × ha-1, sendo17 dessas em lactação, podendo produzir 272 L × ha-1 × dia-1. Vale salientar que essa evolução tem em sua base a aplicação de conhecimentos de fisiologia vegetal, fertilidade do solo, manejo da irrigação e manejo do pastejo, sendo esses constantemente confrontados com as análises de desempenho econômico.

De posse das informações mencionadas acima, associando-as aos resultados observados em campo, foi desenvolvida uma análise de desempenho técnico e econômico de um módulo de produção de leite. O módulo, com uma área disponível de 5,0 ha, iniciou suas atividades em 2008, com 25 matrizes e estabilizou-se no terceiro ano com 30 matrizes e lotação de 10 vacas por hectare (valor já consolidado) (Tabela 3). Essa avaliação foi realizada em junho de 2008, com posterior atualização (abril de 2012) de valores, como exemplo, o preço do leite pago a um produtor típico desse sistema, valor real do salário mínimo, dentre outros. Salienta-se que os valores são nominais. 

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Os parâmetros relacionados ao desempenho zootécnico e produtivo demonstram que há a possibilidade de se obter valores de produtividades de leite, por hectare, em torno de 67,8 L × dia-1 (Tabela 4). Esse valor aproxima-se do nível mínimo necessário (60 L×dia-1) para a manutenção do fluxo de caixa em patamar adequado para a condição cearense (Região do Baixo Jaguaribe), sob pena de, não sendo obtido, inviabilizar o sistema, com saldo de caixa próximo de zero, e momentos de saldo negativo.

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Quando se avalia a atividade no seu aspecto econômico verifica-se que a evolução dos custos operacionais totais (2008 a 2010) foi de 33,3 % contra 4,8 % do preço do leite (Tabela 5). Recorrendo-se a dados regionais, oriundo de séries mais longas (2005 a 2011), verifica-se que custos como uréia e salário-mínimo evoluíram de R$ 0,66 × kg-1 e R$ 280,00 para R$ 1,20 × kg-1 e R$ 545,00, resultando em incrementos de 81,8 e 94,6%, respectivamente. Nesse período, o valor pago ao produto evoluiu de R$ 0,55 para R$ 0,72 × L-1, resultando em incrementos de 30,9%.

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É verdade que a informação de remuneração manteve-se em patamares positivos, com valor médio ao longo dos anos de 0,87% ao mês, o que equivale a 10% ao ano (Tabela 5). Todavia, caso haja manutenção dessa tendência, com custos evoluindo a taxas de 30% ao ano, e o preço do produto a 5,0% em mesmo período, dentro de pouco tempo estabelecer-se-á condição de inviabilidade econômica dos sistemas. Vale ressaltar que a manutenção da viabilidade econômica observada na Tabela 5 foi, em grande parte, mantida graças à evolução nos parâmetros produtivos (sistema em evolução, com estabilização), condição essa que, depois de estabilizado o sistema, tende a ser minimizada.

Por  fim, enfatiza-se a necessidade de acompanhamento constante quanto ao desempenho dos sistemas nos aspectos zootécnicos, produtivos e econômico. E no que se refere à análise econômica, há que se utilizá-la na buscar da melhoria do sistema, notadamente no que se refere à evolução dos desempenhos econômicos e financeiros do negócio. Deve-se atentar para a avaliação sistêmica, sem apego a determinadas áreas do sistema, pois o mesmo deve evoluir de acordo com as condições regionais, sobretudo no que se refere aos preços dos insumos e do leite. Nesse sentido, observa-se que há a possibilidade de condução de sistemas (800S e 400C), com desempenho econômico similar, mesmo apresentando composição diferente (intensificação via pasto vs intensificação via animal) (Figura 7).

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* Os níveis de intensificação estão na sequência da esquerda para a direita, com menor nível de intensificação (400S) apresentando valores de margem bruta mensal de R$ 53,53 (40% de vacas em lactação) e R$ 908,05 (80% de vacas em lactação). O maior nível de intensificação (800C) apresentou o pior desempenho, ratificando a existência de ponto ótimo econômico, mesmo tendo melhorado o aspecto produtivo. Os níveis intermediários 800S (maior lotação com vacas de menor potencial) e 400C (menor lotação com vacas de maior potencial) apresentaram os maiores valores de margem bruta, ficando próximos. Este último aspecto demonstra a infinita possibilidade de combinações dos sistemas, devendo o desempenho econômico nortear seus ajustes, com atenção para a variação atual de seus aspectos técnicos e as tendências dos sistemas.

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