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Gestão

Tempo de mudança

Tempo de mudança

 

Texto: Marcelo de Rezende

 Em períodos de crise, como o que vivemos agora, ter o controle sistêmico da propriedade é fundamental. Com a restrição de crédito, a alternativa para o produtor é trabalhar melhor o planejamento de suas ações, ser mais preciso na aplicação dos recursos disponíveis e mais eficiente na condução do seu negócio.

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Períodos de dificuldades, como o que atravessa nosso país, exigem criatividade e velocidade na tomada de decisões. A produção de leite, assim como as demais atividades rurais, tem sentido nos últimos meses os impactos causados pela restrição ao crédito, importante para aliviar a situação da atividade em momentos difíceis. Os bancos hoje criam inúmeras dificuldades que tornam quase impossível ao produtor comum cumprir com todas as exigências necessárias que lhes permitam acessar recursos para investimento e custeio da atividade. Sem a válvula de escape do crédito, a alternativa para o produtor é trabalhar melhor o planejamento de suas ações, ser mais preciso na aplicação dos recursos disponíveis e mais eficiente na condução do seu negócio, direcionando seu trabalho na busca da máxima geração de renda na propriedade.

Em situações de dificuldade, em que não sabemos claramente o que fazer, é preciso, em primeiro lugar, identificar com clareza o problema: quanto mais informações disponíveis sobre o negócio, mais precisa será a análise e mais claro estará o alvo a ser atacado. No caso da produção de leite, atividade complexa, rotineira e diária, anotações sistemáticas dos eventos zootécnicos e econômicos que ocorrem na propriedade devem ser um hábito, e certamente ajudam a melhorar a situação do negócio. Informações como despesas e receitas, partos, coberturas e o desempenho produtivo dos animais certamente fornecem informações importantes para qualquer tomada de decisão. Sem informações corretas, não há clareza sobre o que se deve atacar; é como um médico que decide operar seu paciente sem que nenhum exame seja feito, baseando-se apenas nos sintomas descritos pelo doente; corre-se o risco, nesse caso, de que surpresas desagradáveis aconteçam na mesa de operações, colocando em risco a vida do paciente. Assim é com qualquer empreendimento, quanto mais informações disponíveis, maior a possibilidade de acerto.

Muitos produtores se queixam do desempenho econômico da atividade, porém a falta de dinheiro é apenas uma constatação, um sintoma, ainda que grave, de que as coisas não vão bem na condução do negócio. O mais importante é que o produtor trabalhe para identificar quais fatores estão levando a fazenda a essa situação de falta de recursos, para que possa neutralizá-los, revertendo, dessa maneira, uma situação econômica desfavorável. Em períodos de maior oferta de crédito é comum produtores se utilizarem desses recursos para encobrir os sintomas da ineficiência de seu negócio, fazendo vista grossa em relação àquilo que tem que ser melhorado e que pode comprometer seu futuro na atividade. Por essa ótica, a baixa disponibilidade de crédito também tem seu lado positivo.

Uma vez identificado o problema, a energia e os recursos disponíveis devem ser direcionados todos para a solução. São comuns fazendas que procuram orientação técnica em situações-limite, principalmente no que se refere às finanças da atividade. Em muitos casos a saída está na utilização do capital empatado em animais improdutivos do rebanho (vacas secas e vazias, animais com problemas reprodutivos, de baixo desempenho produtivo, número excessivo de bezerras, novilhas e machos), incapazes de gerar renda no curto prazo e que contribuem muito para o aumento das despesas na fazenda. Ajustes no rebanho possibilitam a geração rápida de renda, condição favorável para fazendas que se encontram com dificuldades de caixa.

A tomada de uma decisão de impacto, que ataque de maneira precisa e eficiente o problema, permite que o produtor respire e, assim, possa raciocinar e trabalhar para a criação de um ambiente favorável para a organização gerencial e produtiva de seu negócio. A partir daí é preciso que o produtor aplique conceitos produtivos e gerenciais que lhe permita estabelecer metas zootécnicas e econômicas dentro da fazenda. Estrutura de rebanho (participação de cada categoria na composição do rebanho), produtividade (em litros/ha/ano), fluxo de caixa (sobra financeira após o pagamento das despesas operacionais e dos investimentos realizados), porcentagem da renda comprometida com o pagamento de despesas operacionais, capital investido para cada litro de leite produzido (R$ investidos/litro produzido) e retorno sobre o capital investido, são bons parâmetros que nos permitirão estabelecer metas de médio e longo prazo em busca da sustentabilidade da atividade leiteira.

 

Análise da conjuntura

Nos últimos dois anos foram apresentados nesta coluna diversos casos de produtores assistidos pelo trabalho técnico da Cooperideal e que aplicam na atividade leiteira conceitos produtivos objetivando a máxima geração de renda nas fazendas. Fizemos um apanhado dessas propriedades, agrupando as informações de maneira que essas fazendas pudessem ser analisadas como uma única propriedade, a partir de índices médios obtidos. Foram agrupadas 17 fazendas e os índices médios dessas propriedades permitiram estabelecer uma fazenda média que nos possibilitará analisar como seria seu desempenho atualmente, considerando que todas elas aplicam conceitos produtivos de intensificação no uso dos recursos disponíveis (terra, capital, trabalho e conhecimento) e se utilizam dos parâmetros apresentados anteriormente como balizadores de desempenho da atividade.

A fazenda média que vamos analisar é fictícia, mas as outras 17 que deram origem a ela existem e estão em produção. A estrutura zootécnica e econômica dessa propriedade média, formada pelos índices médios das 17 propriedades agrupadas, está descrita na Tabela 1, e sua análise nos permitirá concluir que quando conceitos adequados de intensificação e de geração de renda são aplicados dentro do sistema de produção, é possível a obtenção de resultados econômicos satisfatórios com a produção de leite.

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A área utilizada para a produção de leite dessa fazenda média obtida é de 28,0 hectares, e nela a produção diária é de 1.019 litros. Para efeito de comparação, a fazenda leiteira média da região Sul do Brasil tem ao redor de 20 ha como área média, com uma produção diária de aproximadamente 100 litros/dia; assim, essas propriedades da região Sul produzem, em média, cerca de 5 litros de leite/ha/dia (100 litros/20 hectares), enquanto que a propriedade média analisada produz 36,4, produtividade 7 vezes maior. É sabido que a região Sul se destaca em termos de produtividade em relação às demais regiões do país, cujo desempenho é ainda pior.

É possível observar, nessa primeira análise, que o tamanho da área disponível para a produção de leite não é um fator limitante ao crescimento da produção, pois existe atualmente tecnologia disponível para produtividades superiores a 100 litros/ha/dia. A produção de forragem a partir da utilização de plantas de alto potencial produtivo, uso de animais com aptidão para a produção de leite e aplicação de técnicas de manejo e conforto dos animais permitem grandes incrementos produtivos, mesmo em propriedades com áreas diminutas. A produção média das vacas em lactação da propriedade média analisada é de 18,4 litros/dia, demonstrando que quando animais de bom potencial genético são utilizados em um ambiente de nutrição e conforto adequados, os resultados aparecem; essa produção média obtida é mais de 3 vezes maior que a produção da vaca média brasileira.

No grupo de propriedades que deu origem à propriedade média, a menor produção média por vaca foi de 12,7 e a maior de 23,1 litros/vaca/dia. O rebanho médio das propriedades analisadas tem um total de 130,5 cabeças; dessas, 70,5 são vacas (54,0%) e 60,0 são animais em crescimento (56,0%). Do total de vacas do rebanho (70,5 cabeças), 78,7% permaneceram em lactação no decorrer do ano (55,5 cabeças ou 43% de vacas em lactação em relação ao total de cabeças do rebanho). Essa fazenda média se aproxima da estrutura de rebanho ideal em termos de geração de renda, que define como rebanho estruturado aquele que mantém em sua composição mais de 60% de vacas, sendo que, destas, mais de 83% devem estar em lactação no decorrer o ano, fazendo com que as vacas em lactação venham a compor ao redor de 50% do rebanho.

A produção de leite a partir de um rebanho estruturado garante que mais vacas estejam em produção, gerando renda para a atividade, e que a quantidade de animais em crescimento esteja adequada, de maneira a suprir as necessidades de reposição e de crescimento do rebanho, sem que haja sobrecarga do número de animais improdutivos em relação aos que produzem e que geram renda para o negócio.

O índice “Vacas em Lactação por hectare (VL/ha)” é composto pela participação de uma série de outros índices, e seu valor encerra todas as perdas ou ganhos obtidos por eles, tendo grande impacto sobre o resultado econômico da propriedade. Por ser obtido de maneira simples (divisão do número médio de vacas em lactação no período pela área utilizada) esconde sua grande complexidade e impacto no resultado financeiro da propriedade. A estrutura do rebanho (participação de cada categoria animal na composição do rebanho), a reprodução e a persistência de lactação das vacas (fatores que interferem na % de vacas em lactação da fazenda) e a eficiência no uso da terra (capacidade de suporte da propriedade em função de sua produção de forragem), definem o índice “VL/ha”. O valor obtido por este índice, quando multiplicado pela produção média das vacas em lactação do rebanho, resulta na produtividade do sistema. A fazenda média obtida teve, em média, 1,98 vacas em lactação/ha, com uma média de produção de 18,4 litros/vaca em lactação, atingindo uma produtividade de 13.298 litros/ha/ano (1,98 VL/ha x 18,4 litros/vaca x 365 dias). O índice “Produtividade do sistema com equivalente leite” soma à produtividade do sistema também a renda oriunda da venda de animais, que quando dividida pelo preço de venda do leite é transformada em litros de leite e somada ao volume de leite produzido na fazenda. No caso analisado, a produtividade com equivalente leite obtida foi de 16.441 litros/ha/ano, número mais de 6 vezes maior que a produtividade média brasileira. Do grupo analisado, a propriedade com maior produtividade produziu mais de 34.000 litros/ha/ano.

 

Controle financeiro 

Em relação ao desempenho econômico, a fazenda média analisada obteve um fluxo de caixa anual de R$ 179.291,23, que equivale a um ganho mensal de R$ 14.940,91. O fluxo de caixa representa o valor que efetivamente fica no bolso do produtor, sendo calculado pela diferença entre o valor de todas as receitas (venda de leite, venda de animais, etc) e todos os desembolsos (pagamento de despesas de custeio e pagamento de investimentos) da atividade na fazenda. A análise mostrou uma fazenda média competitiva e segura: o fluxo de caixa/área, obtido pela divisão do valor do fluxo de caixa pela área utilizada, resultou em um valor embolsado de R$ 6.403,50/ha/ano, muito superior aos ganhos por áreas obtidos com as demais atividades rurais.

No que se refere à segurança da atividade, a fazenda desembolsou apenas 52,1% da receita para o pagamento de despesas operacionais, fato que proporciona margem para que a propriedade atravesse com tranquilidade possíveis momentos de queda de receita em função de oscilações de preço do leite ou de qualquer dificuldade que a atividade possa enfrentar. As propriedades analisadas e que deram origem aos números médios analisados tiveram um crescimento patrimonial médio de 230% no decorrer dos anos de acompanhamento técnico, ou seja, foram possíveis ganhos oriundos da produção e também da valorização do patrimônio, graças à rentabilidade do negócio, que possibilitou investimentos em estrutura, máquinas, fertilidade do solo e qualidade do rebanho no período.

Mesmo com uma boa evolução patrimonial, a propriedade média analisada ainda obteve um ótimo retorno sobre o capital investido na atividade, de 13,6%, demonstrando a viabilidade da atividade leiteira mesmo quando se considera os custos com a remuneração do capital investido e com os pagamentos das depreciações de máquinas, equipamentos e instalações.

 

Lição positiva

A junção das informações obtidas junto a um grupo de produtores com acompanhamento técnico sistemático, onde a gestão é feita com base em informações confiáveis e os objetivos traçados diante de cenários realistas, resulta em um resultado final bom, ainda que alguns dos produtores participantes na análise ainda estejam no início da sua caminhada rumo ao desenvolvimento técnico e econômico da atividade.

O resultado médio obtido demonstra que a atividade leiteira é rentável, e que esse resultado pode ser obtido por qualquer produtor que se dedique a organizar e gerir de maneira eficiente o seu negócio. A quase totalidade dos produtores que participaram dessa análise buscou orientação técnica em situação de grande dificuldade, de pouca renda e quando já não acreditavam mais no sucesso do negócio, mas, ainda assim, com a orientação correta e a dedicação necessária, conseguiram reverter o quadro e hoje são exemplos de superação para todos aqueles que também desejam virar o jogo na produção de leite.

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