Eficiência reprodutiva na pecuária leiteira
Identificar o componente do sistema que mais impacta a reprodução do rebanho permite recalcular a rota das ações que guiam a conquista da eficiência geral no negócio.
Quando pensamos na eficiência de uma fazenda leiteira, automaticamente nos lembramos de ações rotineiras realizadas nos setores da reprodução, nutrição, sanidade, entre outros que, em conjunto, impactam diretamente nos resultados da atividade. Ao analisar os números de fazendas eficientes, ou seja, aquelas que produzem leite com boa margem de crescimento e retorno da atividade, é possível constatar grande assertividade nas ações que refletem na eficiência geral do negócio.
No entanto, para chegar em níveis consideráveis de eficiência, é necessário percorrer caminhos que contêm numerosas variáveis que interferem no resultado. Entender o sistema como um todo, realizar o diagnóstico da propriedade para identificar os principais problemas e colocar em prática propostas de melhorias tendem a ser excelentes recursos para clarear os caminhos e amenizar as variáveis. Dos componentes da fazenda leiteira, talvez a reprodução seja o de maior expressividade, quando analisamos o impacto no conjunto do sistema de produção em curto, médio ou longo prazo.
Entretanto, isso não significa que a reprodução é operada de forma isolada; ela é altamente dependente da nutrição, sanidade, recria, genética, produção de comida, mão de obra, entre outras áreas.
Quantificação dos problemas
Quais são as possibilidades de problemas relacionados à reprodução em fazendas leiteiras? Você é capaz de quantifi cá-las? Seriam cinco, quinze ou, até mesmo, cinquenta possibilidades? Há quem diga que os problemas relacionados à reprodução são infinitos.
De fato, tudo o que está envolvido na rotina da fazenda de leite pode interferir na reprodução dos animais – literalmente, tudo. Deficiência nutricional, volumoso de baixa qualidade, estresse térmico, ectoparasita, doença infecciosa, conforto, mudança brusca no manejo e, até mesmo, as atitudes e os comportamentos das pessoas que estão em contato direto com as vacas.
Foto 1. A saúde da glândula mamária faz parte do conjunto de fatores que impacta o desempenho reprodutivo das fêmeas leiteiras.
No entanto, se trabalharmos com esse volume de intermináveis problemas, a chance de evoluirmos de forma notável na reprodução do rebanho é mínima ou nula. Por esse motivo, para que haja sucesso reprodutivo, é importante centralizarmos as ações em poucos problemas, desde que sejam representativos e abranjam todos os aspectos da reprodução.
Retomamos, então, à pergunta: quantas são as possibilidades de problemas relacionados à reprodução de vacas leiteiras?
Resposta: Três! Isso mesmo, apenas TRÊS problemas podem comprometer o desempenho de fêmeas leiteiras aptas à reprodução
Quais são eles?
• Taxa de serviço: as vacas não estão recebendo serviço (inseminação, cobertura, etc.);
• Taxa de concepção: as vacas não estão tornandose gestantes;
• Perda de prenhez: as vacas não estão mantendo a gestação.
Quais os motivos específicos para cada uma das possibilidades?
Problema 1: Taxa de serviço
A taxa de serviço consiste no indicador amplamente utilizado para acompanhar e monitorar a eficiência da reprodução dos rebanhos leiteiros. Dos fatores que interferem em seu sucesso, os principais são as condições anovulatórias (anestro), a ineficiência na detecção de cio e a ausência de rotina e de programas reprodutivos na operação da fazenda.
A retomada da ciclicidade ovariana após o parto ocorre de forma gradual, de forma a ser bastante relacionada ao status metabólico do animal. Vacas que passam por períodos de transição ainda mais desafiadores, por exemplo, podem apresentar maior queda no consumo alimentar e, como consequência, necessitam mobilizar mais reserva corporal para atender as exigências nutricionais do organismo, desenvolvendo balanço energético negativo mais acentuado.
Esses eventos contribuem para que parte da energia que seria direcionada à reprodução seja priorizada para a mantença e produção de leite, reduzindo a atividade dos ovários e a expressão do cio. Portanto, ajustar os manejos e reduzir ao máximo os desafios no período de transição é essencial para o sucesso dos eventos reprodutivos no pós-parto.
Além da ciclicidade ovariana, a maioria das propriedades não detecta os episódios de cio com eficiência.
Esse fato pode estar relacionado ao nível de produção dos animais, pois as vacas modernas de alto desempenho produtivo tendem a expressar cios de menor duração e intensidade. Além disso, boa parte das atividades do estro ocorrem no período noturno, quando, usualmente, não há colaboradores presentes. Entretanto, grande parte das falhas na detecção de cio acontecem em função da ausência de rotinas e programas reprodutivos.
É bastante comum nos depararmos com gestores que acreditam que observar cio somente quando as vacas são guiadas dos lotes para a ordenha é suficiente – e que isso consiste na rotina reprodutiva. As rotinas reprodutivas devem ser elaboradas e executadas de forma sistemática, ou seja, devem ser definidos os dias em que manejos pré-determinados acontecerão, como os dias para início e continuação dos protocolos de inseminação, os dias (todos!) para a observação de cio (com o auxílio de bastão de cera, raspadinha, etc.), entre outros.
Estabelecer rotina reprodutiva é sinônimo de organização e padronização do serviço, o que permite, além de otimizar a efi ciência reprodutiva dos animais, visualizar o cenário real do rebanho por meio de indicadores coerentes e acurados.
Problema 2: Taxa de concepção
Os fatores que influenciam a taxa de concepção são mais complexos, pois os demais componentes do sistema impactam a fertilidade das vacas, à exemplo de doenças, condição anovulatória, nutrição, estresse térmico e técnica de inseminação.
ESTABELECER ROTINA REPRODUTIVA É SINÔNIMO DE ORGANIZAÇÃO E PADRONIZAÇÃO DO SERVIÇO
Foto 2. A inspeção do aparelho reprodutivo da fêmea bovina compõe o rastreamento que levará ao diagnóstico situacional do rebanho.
Doenças, condição anovulatória e nutrição estão intimamente relacionados. Vacas que consomem matéria seca aquém da necessidade nutricional e, além disso, consomem dieta desbalanceada, são mais propensas ao desenvolvimento de doenças metabólicas e infecciosas. Vacas malnutridas e doentes demonstram redução considerável da condição ovariana e da fertilidade e, consequentemente, têm menor taxa de concepção. Portanto, a lição é clara: alimentar corretamente as vacas e prevenir a ocorrência de doenças contribui positivamente tanto para a taxa de serviço quanto para a taxa de concepção.
Pesquisadores objetivaram quantificar o impacto do estresse térmico sobre a reprodução das vacas leiteiras. De forma majoritária e unânime, os resultados indicaram que os animais submetidos ao estresse térmico tiveram pior desempenho reprodutivo, quando comparados àqueles criados em situações de conforto térmico. Conforme explicado, a elevação da temperatura corporal das vacas exige a ativação de processos fisiológicos de termorregulação que alteram as rotas de equilíbrio do organismo e prejudicam a concepção.
Por outro lado, água, sombra, vento e tempo são os quatro pilares essenciais para a execução de um sistema adequado de resfriamento térmico aos animais.
Dentre os fatores citados, a técnica de inseminação tende a ser a mais facilmente compreendida. Armazenamento e manejo do sêmen, temperatura de descongelamento, montagem dos equipamentos, higiene do processo e deposição correta do sêmen são alguns dos pontos que influenciam diretamente no resultado positivo da técnica. Realizar auditorias periódicas pode ser boa estratégia para evitar surpresas negativas decorrentes de passos da inseminação que não são seguidos corretamente.
Problema 3: Perda de prenhez
O sucesso reprodutivo do rebanho não consiste apenas em servir as vacas de modo que elas obtenham boa concepção. É necessário que as gestações sejam mantidas para efetivamente gerarem um parto, o que significa que as perdas de prenhez devem ser baixas.
De forma geral, a perda de prenhez está estreitamente relacionada à taxa de concepção, sendo que grande parte dos problemas com concepção baixa envolvem perda de prenhez alta.
Ou seja, é muito comum que rebanhos com baixa taxa de concepção apresentem alta taxa de perda de prenhez antes do primeiro diagnóstico de gestação.
Foto 3. O sucesso reprodutivo do rebanho também depende da manutenção da gestação e da geração do concepto, ou seja, da baixa taxa de perda de prenhez.
Em vista disso, além daqueles já citados no tópico sobre taxa de concepção, a técnica pela qual a vaca está emprenhando também estabelece relação com a perda gestacional (fertilização in vitro, transferência de embrião, inseminação artificial, etc.).
Considerações
São inúmeros os problemas que influenciam a reprodução dos rebanhos leiteiros. Entretanto, é possível resumi-los em três: taxa de serviço, taxa de concepção e perda de prenhez. Realizar o diagnóstico situacional da reprodução do rebanho e identificar em qual desses pontos se encontra o problema é essencial. Por fim, recalcular a rota das ações de melhoria possibilita que o avanço da reprodução seja mais sólido e efetivo.
REFERÊNCIAS
BRUNO GUIMARÃES
Médico Veterinário e técnico da Equipe Leite Grupo Rehagro
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